quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Vítor, meu rapaz

Vítor, meu rapaz
Não tenho a certeza de já te ter dito que numa ocasião caí do camarote do cinema… eu não estava realmente no camarote.. eu estava dentro do filme, no interior da película, em cada fotografia e não havia realizador, nem aderecistas, nem ninguém a não ser a acção… e eu estava lá…
Foi um pânico, como calculas, pois fiquei pendurada e a irreflexão dos meus companheiros fê-los rir a bom rir sem se lembrarem de me içarem pois estava segura com as mãos que escorregavam a cada décimo de segundo e o medo e as batidas do coração nos meus ouvidos, que se misturavam com os gritos das pessoas, não me deixavam ouvir a mim própria…
Invejo essa ternura dos tempos de namoro, que perdi. Sempre fui muito ao cinema e os melhores momentos, de maior cumplicidade, os beijos mais especiais, os olhares mais profundos que em silêncio diziam tudo, aproveitando cenas mais luminosas oriundas do écran ou as mais escuras para apertar a mão com mais carinho, nem sempre com mais força… tudo isso aconteceu no cinema…
Vais-te rir, mas eu tinha sempre o mesmo pensamento, no tempo de Inverno e, propositadamente, não levava chapéu de chuva, pois sabia que o João levaria e, assim, se chovesse à saída do cinema, desceríamos a Avenida da Liberdade, de braço dado a misturar calores, depois duma sessão no S. Jorge ou no Tivoli, os nossos favoritos.
Hoje ele vai ao cinema sozinho… algo que nunca fiz. O cinema é muito importante para mim e não faz sentido ir sozinha… tenho que o partilhar seja bom ou mau e sinto a falta duma mão para descansar a minha dentro dela. Sinto a falta dum ombro para apoiar a cabeça e faço-o com frequência com a minha irmã.
Quando falas do teu anjo e, à medida que te vou lendo, parece-me que, embora nadando em lagos de simplicidade, és muito exigente, logo, o teu anjo… deve ser verdadeiro… e eu associo a cor branca à tua namorada, quase me arriscava a dizer, à tua Dama do Lago.
Eu, de anjo não tenho nada, nem posso dizer que quisesse ter. Agora, o que queria mesmo era ter alguém que me fizesse aos olhos dos outros, um anjo… isso é amor, daqueles dos filmes, que são os únicos verdadeiros. Sabes, eu penso muitas vezes que a vida devia ter uma particularidade dos filmes… para onde nós fossemos devia haver música sempre atrás de nós… por vezes, a minha irmã, quando andamos juntas, vai uns passos atrás de mim a cantar baixinho… pensam que somos malucas, mas é tão bom…
Acredita em mim, a vida é um filme…
Uma mão cheia de abraços
Camila

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