quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

20 de Dezembro de 2005

Meu caro Professor Doutor Lagos Faria
Foi amável em visitar-me, neste meu canto “descomportado”, tão ao meu jeito.
Foi honesto ao dizer-me aquilo que muitos outros já tinham pensado mas que, talvez por eu ter este aspecto verdadeiramente ameaçador…, nunca tinha sido questionado: os quadros no chão!
Vejo dezenas de pessoas por dia que passam aqui pelo atelier, meus clientes. Bem, para ser precisa deveria dizer ‘os clientes’, caso contrário pode pensar que existe aqui uma qualquer forma de propriedade, como se tivesse escravos, ou algo semelhante. Mas continuando e concluindo: não converso com eles.
Transmito-lhes informações, aconselho-os, mando-os calar também quando os disparates são muitos; enfim, não me surpreendem a meio da tarde, repentinamente, iluminando-me, ou seja, funcionando como o abrir de uma janela por onde entra a voz doutras luminosidades e ventos, por um só instante, mas que dá um arejado que se mantém, pelo menos, até ao dia seguinte.
Gosto de sentir o ar rarefeito da discussão, nem que dure apenas um minuto. Costuma-se dizer que devemos falar devagar e pensar depressa. Porquê? Porque raramente se consegue fazer as duas coisas em simultâneo com rapidez, atingindo sucesso. Não me pareceu o seu caso.
Glória aos piratas!, como diz a canção. Saqueiam mas deixam no ar um cheiro a feitiço.
Quando vier para estes lados, não deixe de visitar estes humildes aposentos: quem os habita não tem nada de palaciano, parece não admirar nem dar importância e mostrar desprezo pelo que tem valor, mas aprecia visitas inesperadas e conta com a sua clemência para que lhe seja perdoada esta inconveniente mensagem.

Queira aceitar os meus sinceros cumprimentos
Camila Ribeiro

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