segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

S. Paulo

Em S. Paulo não há telhados vermelhos, angulosos e com as risquinhas onduladas das telhas que dão um calor único aos chapéus dos prédios. Lembro-me de Florença com telhados vermelhos escuros, de Lisboa com encarnados diversos, uns mais vivos, outros descolorados, mas lindos e quentes. Varsóvia com telhados pretos xistosos brilhantes e, apesar disso, com um calor estranho, talvez dos ângulos que lhe conferem um ar de protecção.
S. Paulo tem um céu pejado de helicópteros, que levam gente com pressa de edifício em edifício mas sem a elegância dos acrobatas. Quem não espera a visão pensa logo num cenário de guerra, depois vem a estupefacção pela quantidade de brinquedos que se elevam e aterram rapidamente, fazendo barulho que se mistura na voz da cidade, rouca de tanto gritar.
Disseram-me que a cidade está a 900 metros de altitude, colocada sobre uma escarpa. Bem, a escarpa é minha, que assim refiz o relevo em direcção ao mar. Mas se a malha urbana fosse uma ilha, o areal circundante seria imenso e os grãos de areia revelavam-se pequenas casas, degradadas, pobres e feias onde nem as diferentes cores com que estão pintadas nos abrem um sorriso. Porém, com mais facilidade imagino as pessoas que lá vivem do que as que vivem nos prédios. Aconselham a afastar-me desses locais, sem saberem que eu própria sou uma faveleira, sem saberem que me sinto sempre próxima das pessoas que querem mudar, que parecendo uns pobres desgraçados, têm um coração como todos os outros e uma cabeça fervilhante de ideias e desejos. Assim sou eu, que marcho diariamente para o centro duma capital europeia, igual aos milhões que vão diariamente para o centro de S. Paulo. Com mais trânsito, com menos trânsito, com sotaques diferentes, um mais dengoso e sorridente que o outro, com níveis de stress diferentes por causa da gigantesca dicotomia, são cidades com virtudes e defeitos mas com uma coisa em comum: pessoas. São essas que fazem a verdadeira diferença.
Gostei da cidade, mas não a amei. Passeei pelas ruas mas não me perdi. Fiz compras mas não trouxe cicatrizes.

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