A Protecção de Dados chumbou o projecto de videovigilância que a Câmara da Amadora queria instalar, considerando que se criavam cenários intrusivos na vida das pessoas. Alguém perguntou às pessoas da Amadora o que pensavam sobre o assunto? Talvez não fosse má ideia e talvez a Protecção de Dados tivesse que engolir em seco. Outra possibilidade era a Protecção de Dados instalar-se na Amadora. Será que mantinham a decisão?
De facto, ninguém gosta de ser observado. Mas, de facto também, todos gostam de observar. Muitos dos que se levantam contra a instalação das câmaras de vídeo têm as televisões sintonizadas na TVI e deleitam-se a ver outro big brother. Outro! Só hoje fiquei a saber da existência deste vómito televisivo, mais um. Mas se pensar que há gente para tudo, para matar e roubar e violar e outras acções gravíssimas, é normal que existam pessoas com disfunções menores, como por exemplo, não se importarem de ser observadas 24 horas por dia. Do outro lado da televisão estão milhares ou milhões, igualmente com disfunções psicológicas, de olhos escancarados sentados no sofá hipnotizados a olhar. E só olham, porque se vissem, no mínimo, mudavam de canal. Mas são capazes de eloquentes discursos sobre a defesa da não instalação de videovigilância.
Não gosto de ser observada, mas gosto de me sentir segura e se para isso são necessárias câmaras, pois que as instalem. Não gosto de ver o que se passa na casa do vizinho - nem de ouvir embora tenha que gramar com os berros de fúria do gajo de baixo quando o Benfica ou a Selecção de futebol perdem ou fazem más prestações. Pergunto-me como é possível estar horas a ver o que um bando de imbecis, uma manada ou o que se queira,está a fazer ou que grunhidos emitem. Como é possível? Que alienação colectiva é esta que põe tanta gente a abdicar da sua própria vida em prol de espiarem o dia a dia de outros? Outros que, se bem me lembro há anos, quando nasceu a moda dos big brothers e tive curiosidade em ver, eram um conjunto de idiotas. Serão estes diferentes? Não me cheira. Hoje ouvi uma conversa sobre o assunto em que nomes de pessoas são enunciados como se as conhecessem. Catalogam-nas com epítetos nada agradáveis e mesmo assim são fiéis. É quase uma missão assistir, como se estivessem sentados no banco da missa onde vão por receio que a ira divina caia sobre eles se faltarem. Já lhes conhecem as taras e manias, apontam os copos e pratos e edredons (que é feito dos cobertores?)que usam e sabem onde se compram. Ah, a maravilhosa sociedade de consumo, sempre presente e sempre atenta.
Sugiro que as pessoas se filmem a elas próprias a assistir, sentadas frente à televisão e ouçam depois os seus próprios comentários. Se tiverem dois dedos de testa vão confirmar a deplorável figura que fazem e fechar cortinados e janelas para ai sim, fazerem tudo ao seu alcance para não serem vistas, observadas ou filmadas.
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