Algures na nossa memória moram lembranças vividas ou relatos de alguém que nos contou que quando o correio chegava a aldeia apinhava-se para o receber e para o ouvir ler. Esticavam-se as orelhas ansiosas para as nossas notícias e curiosas para as alheias. Depois, depois vivia-se meses (e anos) com aquelas novidades, vindas de longe, longe de caminho e longe de tempo.
Ouvi uma vez uma história maravilhosa sobre uma rapariga que tinha ido trabalhar para longe da casa dos pais; escreviam-se mutuamente e, não havendo ainda selos, os ‘portes’ eram pagos pelo destinatário quando recebia a correspondência. Por falta de dinheiro arranjaram então diversos estratagemas para, sem ficarem com a correspondência que lhes era endereçada, saberem uns dos outros: com olhos lacrimelanjes a pequena pedia que, pelo menos, lhe lessem a carta mesmo que não lha entregassem, e corações mais bondosos, lá a satisfaziam; outras vezes, depois de ler a carta, afirmava que, afinal, não era para si! Outras ainda, faziam desenhos, facilmente perceptíveis, e depois de os verem já não aceitavam a correspondência.
Num mundo como hoje em que escrevo instantaneamente para qualquer parte do mundo não é concebível a angústia ou a impaciência pela demora de notícias e estes relatos de gente em afã por novidades parecem pertencer a outras dimensões quando, na verdade, são apenas de ontem.
A espera era materializada por vários momentos igualmente inquietos. Esperava-se. Haverá notícias hoje ou não? O chamamento dos nomes dos destinatários era acompanhado dum padecimento fruto do desconhecimento sobre se o nosso seria um dos eleitos ou não. Podia não ser e a espera continuava.
Quando havia um envelope ou um seu antecessor para nós, na grande maioria das vezes havia ainda que esperar que a chamada fosse terminada e ficava-se na fila para a leitura. Tudo, ou quase tudo, era comum. Se um recebia boas novas todos mostravam sorrisos de alegria; se eram tristes, solidarizavam-se irmamente. As notícias eram ribeiros onde nos era concedido refrescar, mesmo em propriedade alheia.
Lida a notícia faltava repeti-la a outros, reproduzi-la, fazê-la reviver e renascer no seu recapitular. A seguir vivia-se a indemnização da espera.
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