quinta-feira, 22 de abril de 2010

Júlia querida

Júlia querida

Pedes-me que te fale das crises do séc. XIV, como um mal benéfico, mas duma forma invulgar. Cá vai o texto prometido.
O século XIV foi primorosamente recheado de crises. Supostamente, a abundância apenas se revelou nas fomes, nas pestes e nas guerras.
Parecendo ter sido um século negro, numa segunda análise, ou numa primeira mais aprofundada, verifica-se que assim não foi.
Se tivermos em conta que as guerras podem ser actos de amor e sendo este, normalmente, associado à cor branca bem como à abundância de sentimento, que exala por todos os poros, deixando o coração ora aos saltos, ora como morto, passando por espasmos não explicados por ciência alguma, privando as pessoas de sentirem necessidades básicas, como vontade de beber ou comer, sentindo falta de algo, que não pedaços de comida normal e tradicional, da que normalmente se serve à mesa e hoje em dia se come de talheres, mas na altura se comia à mão, logo, concluiremos que fome, não havia!
Se não havia fome, uma das causas possíveis da morte e logo associada às pestes, estas, são, na maioria dos casos, uma invenção que foi criando corpo ao longo dos séculos e desde o XIV até agora já lá vão seis completos, o que é muito tempo para se acumularem pormenores para se criar uma irrealidade tida, nos nossos dias, como verdade absoluta e que de facto, não é.
A palavra peste pode querer dizer muita coisa, porém, é universalmente aceite que é sinónimo de algo que se espalha com facilidade. Ora haverá sentimento mais solidário e contagiante que o amor, profundamente incutido nas guerras de que se falou no parágrafo anterior? Podemos então concluir que o amor bailava nos salões abertos dos castelos e ao ar livre que servia de tecto a camponeses e “citadinos” como uma peste, ou seja, como algo a que ninguém ficava imune.
As guerras: sobre elas já se disse, e repetiu, que eram – e continuam a ser –actos de amor. Matava-se por amor. Haverá modo mais nobre e superior de morrer do que por uma causa de amor? Nunca em tempo algum e muito menos no século XIV!
O ‘mal benéfico’ entronca com tudo o que se acabou de dizer: independentemente de, nas guerras e por amor, morrerem mais homens que mulheres, aqueles continuavam em vantagem numérica, constituindo pois um problema arranjar mulheres para todos os homens e assim, enquanto se tentava colmatar esta questão matando alguns dos pretensores, com o avançar do tempo e Renascimento a dentro, constatando-se que a questão não fora inteiramente resolvida, tornou-se necessário criar um sistema aberto de partilha do cerne de toda esta problemática e dinâmica: o amor.
E é assim que entramos no Renascimento e por ele caminhamos, acompanhados pela mais requintada prostituição que, ordeiramente, dividia as os dias e as horas pelos nobres guerreiros, saciados de matar para poderem usufruir de mais horas na companhia das requisitadas damas.
Havia, entretanto, alguns problemas com o abastecimento de víveres aos quartos onde proliferava o amor, mote, como já se disse, de todo este panorama. Porquê? Porque alguns camponeses tinham sido alvo da peste – do amor, se bem se recordam – e dirigiam-se para as cidades em busca de morrer ou matar, deixando os campos vazios e inabitados. Disto pode constituir exemplo, ainda hoje, o Alentejo.
Pareceu-me que querias brincar com alguém… espero ter acertado.
Recebe os meus beijos
Camila

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