quarta-feira, 14 de abril de 2010

Silvestre

Silvestre

Achei espantoso o que me disse: cometer uma traição para confirmar a minha fidelidade à nossa amizade! É original, no mínimo…
Eu, que sou um poço de sensibilidade, tenho alguma inteligência, o que não é de espantar, pois em terra de cegos…, não sou feliz, castro a minha intelectualidade dentro do meu silêncio onde muito poucos entram, gosto de provocar e mais do que saber fazê-lo, tenho dias em que fico incontrolável, encarno personagens que não são minhas, finjo ser quem não sou, visto peles que não se me adequam, tenho um universo de meiguice mas consigo transportar cá para dentro cenários de terror, sou saudavelmente louca e desprendida, nasci no berço da aventura e procuro desesperadamente as minhas raízes, enfim, tenho muitos mares nunca dantes navegados e não se sabe se algum dia serão navegáveis, sequer, quanto mais conhecidos e explorados.
Eu, que tenho orgasmos a ouvir andamentos acelerados de música clássica, um dia encontro-o. Nasce uma amizade. Terá sido assim?
Ou terá sido um encontro tipo matéria e anti matéria, mas ao contrário? Em vez de sermos iguais por fora, mas molecular e atomicamente perfeitamente inversos, somos díspares no exterior e iguaizinhos por dentro? Consegue imaginar-se aos trinta e quatro anos, na vertente de mulher? Sou eu.
Tenho esta sensação espantosa que me revejo no futuro, como se isto fosse possível…
Só assim eu teria a capacidade de perdoar que tenho…perdoo-me a mim própria!
Você só gostava de casar comigo porque casaria consigo e nós somos os nossos melhores amigos, os nossos melhores amantes, quem nos conhece melhor, temos os nossos pensamentos como confidentes, os nossos sorrisos como nossos cúmplices, aturamos as nossas manias e vícios: a pessoa que eu escolheria para viver comigo era eu!
Então, quando a matéria encontra a anti matéria, nasce a consciência, vestida de amizade. E cresce e desenvolve-se e complementa-se. Um fala, o outro ouve e é como se se ouvisse a si próprio. Não precisa de dizer nada. Comungam. Por vezes fazem de advogado do diabo um do outro. Não passam informação um ao outro, já a sabem, podem é não ter consciência dela. Quando a recebem não precisam de arranjar um novo espaço para a guardar, apenas têm que a encaixar no espaço que reservaram. Quando? Mistérios do tempo, do espaço, do real e do virtual, da ciência e da fé. Enfim, da amizade.
Como me enganei… como pude ser tão burra?
Camila Ribeiro

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