quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Pedro e o Lobo

Hoje é Dia de Natal, não por receber, mas por saber que vou dar. Estou com uma ansiedade difícil de controlar e parte dela já foi satisfeita: finalmente instalaram a internet em casa dos meus pais e o meu sobrinho de 8 anos está a dar formação de informática ao avô de 67!
Falo com eles ao telefone e quando digo com eles, é mesmo com eles e não com cada um à vez, embora não haja telefones de alta voz lá por casa, mas como falam todos ao mesmo tempo e por cima uns dos outros, percebo que a algazarra é geral, de satisfação e contentamento. No meio das conversas entre gargalhadas o professor grita-me que repita a palavra passe para entrar no Facebook do avô; o aluno quer saber quem foi que fez aquilo, esquecido das dores e dos 67 anos, com sorrisos que se ouvem deste lado cintilantes como se tivesse a idade do neto. A avó, por agora espectadora atenta, amanhã, quem sabe, pirata virtual, faz de narradora das pressas e anseios de quem maneja o computador. Tenho imensa pena de não estar lá, não a ajudar ou a entrar em explicações, mas como fantasma, para que pudesse ver e ouvir e rir-me à vontade sem que ninguém desse por mim.
Estou inchada de felicidade como um bando de pavões a quem tenham dado a comer um prato cheio daquilo que os pavões mais gostam e que eu não sei o que é!
Mas o Dia de Natal não acaba aqui: logo à tarde darei uma prenda que estava guardada para o dia de hoje e que me tem provocado as maiores gargalhadas dos últimos tempos, ataques de risadas secretas e dissimuladas, mentiras e confusões, tudo com o objectivo de fazer uma surpresa a uma pessoa. A minha amiga I.
Sinto-me como nos dias que antecediam o Natal e queríamos saber e ver o que continham os embrulhos que dormiam em cima do guarda-fato dos meus pais, mas também sabíamos que apenas poderíamos olhar para eles e esperar que chegasse, não a meia noite do dia 24, mas a manhã do dia 25 de Dezembro.
Adoro organizar coisas às escondidas e fazer surpresas; muitas delas surgem naturalmente, como a que pregámos à pobre da L., fazendo-a crer que a S. estava a viver um momento estranho ou como a festa de aniversário de casamento da própria S., que decorreu no meio da maior alegria, com abraços, lágrimas e sorrisos, tudo entremeado.
Como faço estas coisas com frequência os meus amigos dizem-me sempre que um dia, ai minha menina, um dia destes… e eu vou esperando que o dia chegue.
Perdi a conta às surpresas e brincadeiras que já fiz na vida e a cada nova partida sinto-me como no dia em que montávamos a árvore de Natal, depois de termos andado horas a apanhar musgo, de termos arranjado um bocado de espelho, mais tarde substituído por papel prata para fazer o riacho que corria ao lado da casa do Menino Jesus, depois da minha mãe ter desviado metade dos móveis da sala para que o presépio que o meu pai imaginara pudesse caber, sim, porque os presépios que se faziam lá em casa eram apoiados numa armação em madeira com cerca dum metro de altura e vários de extensão. Valiam a pena ser vistos e lamento que na altura não se usassem máquinas de fotografar como hoje para termos provas da magnitude das aldeias temporárias que instalávamos na sala. Mas o que eu mais gostava, aliás como sempre, não era do presépio em si, mas da sua preparação, daquelas andanças no meio do pinhal atrás do musgo, dos caixotes que era preciso arranjar para o trazer para casa, das desculpas que inventávamos ano após ano, para aumentar o tamanho do presépio, juntar-lhe uma nova igreja, mais dois rebanhos de ovelhas, cães que por vezes eram maiores que o pastor, e mais uma fonte que era maior que a ponte, sem que a minha mãe reclamasse muito, de preparar as luzes, de conferir se funcionavam, de ir à drogaria do senhor Casimiro comprar pequenas lâmpadas de substituição, que naquela altura não se deitavam as coisas fora, consertavam-se!
Os últimos dias foram de montar o presépio, uma montagem especial para a I. que hoje vai poder ver em todo o seu esplendor o que é para mim uma prenda de Natal, das verdadeiras, sem que tenha que gastar dinheiro ou que lhe vá ocupar espaço lá em casa, sem que ela a possa perder, partir ou danificar.
E assim, hoje ao fim do dia terei entregues duas prendas de Natal, que calham a ser entregues em Dezembro, mas podiam ser em qualquer altura do ano, porque Natal é sempre que nós quisermos.

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