Viajar, comer, estar com amigos e ir deixando rasto de amizades, é o que se faz em No reservations, pela mão de Anthony Bourdain, cujo cv na matéria pode ser grande, mas não se aproxima da diversidade de paladares que aquela boquinha santa já experimentou. O meu filho e eu assistimos ao programa, deitando lágrimas ocasionais pela tristeza de vida que o homem leva e sem ponta alguma de inveja. Pois.
Concluímos que este sim, era homem para mim: sem papas na língua, no que respeita ao comer e às opiniões, nem sempre ditas, mas expressas em off, para nós, telespectadores.
O site de Bourdain ou não é actualizado há séculos ou navega no futuro pois a última notícia, sobre os Açores, informa que o programa irá para o ar a 26 de Janeiro.
O Travel Channel aloja um blog deste aventureiro de faca e garfo onde Bourdain escreve umas palavras à velocidade aproximada de um post por mês. Na verdade, a expressão de faca e garfo é muito redutora, uma vez que ele mostra preferência por tudo o que seja tradicional e típico, no sentido verdadeiro das palavras e come com as mãos, de garfo, com colher e às vezes com um certo nojo, face às iguarias dignas dum beduíno.
Eu e o Duarte fartamo-nos de rir com a sugestão de acompanhamento parental para ver o programa, repetida e escrita no ecrã; é nítido que aquilo se destina maioritariamente a quem está convicto que as galinhas nascem em pelo e metidas numas cuvetes de onde saltam para a panela, que a carne de vaca, de porco, cabrito borrego ou o que seja, nasce às fatias vestida com película transparente e outras convicções tão fortes como estas.
Em Hollywood, e não só, mata-se por asfixia qualquer um, mas quando é um primo do Calimero a ter o gasganete apertado, ai que horror! A vampiragem que por ai anda baba-se a sugar pescoços, mas facas a sangrarem porcos, dão origem a gritos Aqui del rei! O Tarantino (vénia!) pode mandar Aldo, o Apache, tatuar suásticas na testa de nazis e nós aplaudimos, mas penas arrancadas do rabo duma galinha dão direito a lágrimas e reclamações junto de activistas dos direitos dos animais!
Filmes de terror, de guerra ou de estupidez, que também há muitos neste género, consomem-se mais que sms’s na véspera de Natal, mas leva-se mais depressa os meninos ao cinema do que se lhes mostra um documentário sobre a vida.
Bourdain não se rala nada e vai dançando de acordo com a música, às vezes fazendo trejeitos onde se adivinha a dificuldade em engolir mas com um pensamento forte e inabalável: há que experimentar!
Pela minha parte tenho sempre reserva feita para assistir ao deambular de quem me provoca inveja, que tão depressa está refastelado num restaurante, como a comer num vendedor ambulante no meio da rua. O segredo de tudo passa, acho eu, pelos compinchas que o vão guiando e lhe levam a mão à boca cheia de especialidades.
Gostava de conhecer esta personagem, que se irrita facilmente, que se aborrece, mas que sabe o que quer e do que gosta. Bem, também posso passar sem o conhecer, bastava-me andar atrás dele. Pois.
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