segunda-feira, 19 de julho de 2010

Mãe, precisa-se!

Estou deitada na areia a ler. Levanto os olhos à passagem de três adultos que vêm da água e me salpicam.
Param a três metros de mim e uma das mulheres pergunta:
- A Rita? Onde está a Rita?
- Não sei, ela não tinha ficado aqui?
- Não! Ela foi atrás de ti para a água!
- Ai a minha filha, a minha filha!
Todas as pessoas ali ao redor se levantam e começam a olhar para todos os lados, na esperança de ver uma garota algures a chorar ou com ar de perdida, sinais prováveis de ser a Rita. Mas ninguém vê nada.
A mãe fica ao lado do chapéu de sol a chorar e a chamar pela filha e os outros dois, um homem e a uma mulher, avançam pela areia em direcção ao mar.
Só nesta altura me apercebo que debaixo do chapéu de sol dorme uma criança, com uma ano e tal, dois anos, ou seja, para além de não saberem da Rita, foram à água e deixaram uma criança SOZINHA a cerca de cem metros da água, encostada à parede da praia, o local mais longe da água. Cem metros que, para uma criança daquela idade, que acordasse e se visse sozinha, correspondiam a quilómetros quadrados de medo, de pânico e de choro.
Adiantando a descrição, passados cinco minutos, que confesso me pareceram a mim e a todos os que estavam a assistir àquele filme a cinco anos, lá vem a Rita, meia a chorar, com o homem atrás a dizer-lhe que não se devia afastar! A mãe, sentada na areia ao lado do gaiato que dormia, chora desalmadamente mas, quando vê a filha e se espera que a abrace, não o faz. Abraça-se à outra mulher, a chorar convulsivamente, deixando a criança ali a seu lado com medo, assustada e só. Quando largou os ombros da outra e se lhe secaram as lágrimas deu uma desanca na miúda porque tinha desaparecido.
Não aguentei mais e disse alto e bom som que não suporto pessoas estúpidas e fui à água.
Numa praia cheia de gente não se tira os olhos das crianças, não se espera que elas reajam como adultos porque não são. Somos nós que as perdemos e não as crianças que se perdem.
Aquela mãe centrou em si a angústia de sentir o desaparecimento da filha, mas não se regozijou por a encontrar, não a puxou para si, não a abraçou, não lhe disse o quanto a amava e o quão desesperada estava por a saber sozinha no meio de milhares de pessoas. Não, aquela mãe pensou nela própria e nada mais. Aquela mãe, que vai à água e deixa uma criança pequena abandonada debaixo dum chapéu de sol, longe da água, que perde outra filha, pode ter sido mãe duas vezes, talvez até mais, mas não é mãe do coração de nenhuma daquelas crianças.

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