sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Uma questão de mãos

O Centro Comercial Renovação, nome apropriado para qualquer coisa em Almada, foi a minha escolha de ocasião, precisando de uma cabeleireira com urgência, não me recordo da situação, mas sei que tinha pressa. Nunca lá tinha ido e nunca mais lá fui, aliás, só a premência do meu destino me fez ficar, ainda que muito mal disposta. E porquê? Naquele momento da lavagem da cabeça, que adoro e do qual tenho imensas saudades, a senhora que o estava a fazer, usava apenas uma mão. A outra repousava no bolso, preguiçosa, como lho fiz saber, sendo acompanhada por um pedido de desculpa da proprietária. 
Muitos anos depois, muito longe dali, em Saratov, perto do imponente Volga, diante do hotel decorria uma obra. Um dos trabalhadores encaixava umas pedras, como quem dispõe calçada portuguesa. Sentado no chão, pernas abertas, uma mão guardada no bolso do casaco, a outra dividida entre o martelar e o centrar as pedras, que se acumulavam num monte aos seus pés e era precisamente com um pé que ele arrastava cada pedra que precisava para junto da mão. Uma das pessoas que estava comigo argumentou que talvez só tivesse uma mão; outra pessoa apostou que não, que tinha as duas, que era apenas preguiça, e ganhou. No dia seguinte, ao sairmos em direcção à Universidade, lá estava ele, desta vez de pé, ambas as mãos em acção, uma acção à Ivan Danko, de Red Hot, naquilo que universalmente é conhecido como brincadeira parva, andar à pancada por que lhes apetece. A cena foi interrompida por um homem mais velho que deu ali dois gritos e eles, bem dispostos e a rir, lá meteram as quatro mãos nos bolsos.
Numa outra ocasião, em Lisboa, na plataforma do metro da estação Jardim Zoológico, num dia de chuva intensa, a água escorria por uma parede e colocava-se uma faixa de riscas encarnadas e brancas, desviando os passageiros que ali passassem, evitando quedas e similares. 
A colocação da faixa ocupava quatro pessoas, repito quatro pessoas! 
Uma atava a fita do lado esquerdo, junto de um cartaz de publicidade, enquanto outra segurava o rolo. 
O rolo foi esticado e a fita cortada pela pessoa que o segurava, enquanto um terceiro membro da equipa o atava ao corrimão da escada. 
Um quarto elemento, a uns metros de distância para obter uma visão alargada, levantava e baixava as mãos, qual maestro que orienta a orquestra, fita dois centímetros para cima, fita dois centímetros para baixo, mão espalmada virada para baixo sinal de está bem assim. A missão terminou com a equipa swat a contemplar a obra, satisfeitos e sorridentes. Foi hoje, e assim vai Portugal. 

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