segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Supercalifragilisticexpialidocious

Hoje vim no metro ao lado da Mary Poppins.
Entrou já de livro na mão, mão essa que também segurava uma caneta, enquanto a outra trazia a asa da mala, um chapéu-de-chuva e uns óculos.
Sentou-se a meu lado e começou a organizar-se, tendo pousado os óculos no nariz, corrente meia a balançar, meia deitada sobre o peito, mala no colo, chapéu-de-chuva encostado às pernas e livro de soduku em cima da mala.
A cada tremelique do metro, caia o chapéu, que ela se apressava a apanhar por meio de desculpas; a cada nova paragem e entrada de mais pessoas, caia o chapéu, que ela se apressava a apanhar, já entre desculpas e franzidos de sobrancelhas, como se alguém tivesse culpa dos bíblicos carregos que levava.
Quando o telefone tocou lá nos confins da mala, ela usou uma mão para segurar o livro, a caneta, os óculos e o chapéu, enquanto a outra esquadrinhava os quarteirões de carteiras, papéis, pacotes de lenços, maços de cigarros e eteceteras, cotovelos em riste, sem dar atenção a nada que a rodeava, até que o telefone deu à costa e, em simultâneo, o chapéu voltou a cair, e por cair entenda-se encostar-se a outras pessoas, pois não caia realmente no chão, não havia espaço para isso.
Foi atendida a chamada sem que se deixasse de preencher os quadrados do soduku, e o raio do chapéu, teimosamente continuava a roçar-se pelas pernas dos outros passageiros, e eu só pensava que a partida da família real para o Brasil no longínquo Novembro de 1807 não dera tanto trabalho nem incomodara tanta gente.

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