terça-feira, 22 de novembro de 2011

Ai, que calor...

Sento-me já em voo picado para o livro que ando a ler. Como já comentei aqui, o metro fica cheio na primeira estação, a suburbaníssima Amadora-Este. Apesar do mergulho no livro mantenho um periscópio involuntário através dos ouvidos. À minha frente sentam-se duas mulheres, conhecidas, o que é mau sinal: sei que irão a conversar e me vão distrair. Não vou conseguir visualizar as imagens que o autor preparou para mim através da escrita. Bolas! Bem, concentremo-nos!
Claro que elas vão a conversar e às tantas a antena apanha a seguinte frase, em sussurro, apenas murmurada:
- Havíamos de perguntar a esta senhora que meias é que usa, nem se nota que tem meias.
Sei que o comentário é para mim. Levanto os olhos e deixo Vicente da Bufarda parado diante de sua majestade, El Rei de Portugal e sorrio para as senhoras que me olham como se fossem crianças apanhadas a fazer uma traquinice:
- Não se notam porque eu não uso meias.
- Ah...
- Então é por isso... mas como é morena... parece que tem...
- ... mas ao mesmo tempo parecem invisíveis...
- Pois... o segredo é não se usarem meias, irmos à praia o ano inteiro, andarmos sempre de calções, fazermos caminhadas e, de preferência, caminharmos dentro de água. Desta forma conseguimos umas meias invejáveis e, garanto, perdemos o frio.
Enquanto fazia este discurso, elas abanavam a cabeça em sinal de concordância e apontaram para os meus braços tapados por aquilo que se chama manga curta e disseram-se incapazes de andar assim no inverno, com tanto frio. Esclareci ainda que não usava meias com saias nem com botas, nem com calças, que era uma questão de hábito. Sorrimo-nos e eu voltei à Taberna do Pasquino e a Vicente da Bufarda e a Tomásia e ao enredo, mas principalmente, à forma do magnífico livro que anda nas minhas mãos.

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