A jibóia gorda
que é o metro está parada na estação inicial.
A leitura absorve-me assim que
abro o livro mas não é suficientemente forte para me afastar a atenção de um
jovem que dança diante do vidro.
Ouve-se o pi
que anuncia o movimento das carruagens e que me parece passar despercebido ao
rapaz, que mantém uns auscultadores nas orelhas.
Ziguezagueando no
meio do túnel a escuridão apodera-se do bicho e transforma os vidros em
espelhos. O rapaz aproveita e observa o seu reflexo repetindo gestos que lhe devem ser facilitados pela
música que ouve, baixa e não partilhada com os restantes passageiros.
Está absorto,
sozinho e repete movimentos, inclina a anca, levanta os calcanhares, dobra os
pulsos, vira a cabeça e volta a repetir, descontente e persistente.
A carruagem
segue mais silenciosa que o costume, olhos postos no dançarino, imune aos
curiosos.
Com a entrada de mais e mais passageiros o palco diminui mas ele não
desiste e continua a usar o vidro como espelho para se auto criticar na encenação
que pratica.
Meia dúzia de
estações mais adiante, e já só a simular movimentos de ombros, pescoço e
cabeça, baixa-se graciosamente como se fosse fazer uma vénia. Apanhou a mochila
e saiu deixando a carruagem muito mais pobre.
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