quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Cão danado


Django. O D é mudo. Assim repete o protagonista que distribui tiros mortais quando alguém não cumpre.
O rapaz Tarantino – cujo nome me lembra o meu avô que chamava tarantina ao cinto com que ameaçava os meus primos recém-chegados de Angola e que faziam as maiores tropelias – dirige cenas que podem ser confundidas com fontes luminosas, daquelas que esguicham água colorida, fazem efeitos diversos, mas com uma pequena diferença, ele usa sempre a mesma cor, encarnado-sangue.
Não tenho qualquer predilecção por Leonardo DiCaprio mas darei o braço a torcer pela verdade vista e já reformulei a minha opinião sobre aquele que me parece sempre criança e sem maturidade facial para a maior parte dos papéis que lhe dão. Leonardo é um eterno adolescente muito bonito que precisa de rugas e cicatrizes para ter mais credibilidade nos papéis que desempenha. Reconheço-lhe o esforço e a encarnação nos bonecos, mas depois vejo-lhe a cara e está tudo estragado. Bom, mas aqui revela-se e gostei imenso dele.
Samuel L. Jackson – que adoro – fez-me adorá-lo ainda mais. Perfeito na anormalidade histórica, pois para atingir aquela perfeição só encarnando a imperfeição do irracional, do anti natura, tão natural na época e naquelas paragens.
A justiça e a vingança, nem sempre pelos melhores meios e caminhos, mas faz-se. Faz-se até à distância e, como também aconteceu em Sacanas Sem Lei, queremos acreditar que os bons ganham, mesmo que tenham que morrer alguns.
Hans Landa – Waltz será sempre Landa, como Connery é James Bond, como Harrison Ford é Indiana Jones, como Brandon é o Padrinho – é um bocado de plasticina que ele próprio molda à sua vontade pondo pés de cabra e corpo de gigante, um olhar caleidoscópico, gestos que já lhe eram naturais antes de nascer, enfim, um poço de onde se tira tudo quanto se quer.
Amei a ingenuidade de Jamie Foxx. Forte desde a primeira imagem, não há uma passagem, uma transformação na personagem. Apenas nos é dado ver como ela evolui na exposição daquilo que é na essência. Mesmo agrilhoado já lá estava tudo.
E estava mesmo tudo, a música, os planos, a escolha do formato das letras, tudo nos remete para filmes dentro de filmes – Franco Nero mostra-se durante breves momentos! – como quem faz uma pergunta sobre a actualidade política e leva como resposta a história de Portugal a começar nos Afonsos, mas de forma resumida, sintética e altamente eficaz. Cada filme de Quentin Tarantino é uma viagem, mais que qualquer outro. 

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