Voltei a percorrer O Fio da Navalha. Aquele Larry é inesquecível. Encontrei-o a primeira vez quando era adolescente, em edição de bolso, capa branca com uns metais retorcidos que me faziam confusão. Lembro-me de ter saído de lá e entrado noutras casas a perguntar com os olhos o que era aquilo dos Ashrams, quem seria Ganesha e de me ter deixado conduzir por leituras sobre o assunto que depressa abandonei por me parecerem muito confusas.
Depois apareceu um filme supostamente baseado no livro e fui ver. Saí de lá com vontade de pedir o dinheiro de volta e vinguei-me em nova leitura. Há pouco tempo fui premiada com uma nova edição, da colecção Vintage da Asa, que acabei de ingerir agora.
Há releituras com personagens que são tão marcantes que se me afigura absolutamente normal vê-las vivas, mesmo sabendo que já assisti e acompanhei a sua morte há anos atrás. É a intemporalidade. É a diferença entre vermos uma fotografia de alguém e dizermos ‘Este era o meu Tio fulano’ e vermos uma imagem de César e exclamarmos ‘Este é César’.
Os Césares são imortais, como os Leonardos, os Rafaéis, os Albertos, os Alfredos, e podia seguir até se me acabar a tinta e mesmo assim ficava a lista coxa.
É impossível não amar Larry e, em simultâneo, ter medo de o encontrar. Vê-lo, vê-lo mesmo, não só olhá-lo, é vermo-nos a nós próprios ao espelho, sem máscaras nem pinturas e questionarmo-nos sobre a vida. Ora, actualmente, perdeu-se o hábito de nos fazermos esta pergunta: é meia bola e força, muito palavreado mas pouca acção, faz o que eu digo, não faças o que eu faço e quejandos.
Conheço muita gente, demasiada, que olhariam Larry como olhariam para um unicórnio, admirando-o, mas com a certeza da sua não existência, virando-lhe as costas com um encolher de ombros. Essas mesmas pessoas mostrariam vibrar com as atitudes de desprendimento material de Darrel, e manifestá-las-iam com o rabo agarrado aos seus sofás e canapés aprovados antecipadamente por Elliot Templeton. Nem lhes passaria pela cabeça que há alguém capaz de certas atitudes sem fazer qualquer esforço. Como Larry. Mas como Larry é uma personagem, acabamos todos a comer pescadinhas de rabo na boca!
quarta-feira, 20 de julho de 2011
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... "o fio da navalha"... maravilhosa descoberta devorada no verão dos meus 16 anos, numa edição do circulo de leitores cuidadosamente arrumada numa estante da mãe de um amigo! :)
ResponderEliminarSerá o meu próximo livro a ler, vi o filme recentemente mas não me convenceu, vou à busca do Maugham que me encantou no "Servidão Humana" e "O Véu Pintado".
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