Como disse a minha irmã morreu uma árvore da nossa família, a Tia Josefa.
O que nos ligava era uma sucessão de momentos únicos que aconteciam sempre que a visitávamos, coisa que durante muitos anos fazíamos com muita frequência pois, se não chegasse o facto de os meus avós viverem com ela, era mais do que suficiente ela ser a mana querida do meu pai, a mana Zefa, dedicação que se entendia também à minha mãe.
A Tia Josefa era doméstica mas o sonho da vida dela era ter sido enfermeira e não havia ocupação que lhe encaixasse melhor. Embora vivesse em Lisboa há séculos nunca perdeu o sotaque alentejano e era com ele que nos contava histórias de antigamente, do meu pai, da família e de pessoas que desconhecíamos mas que, a meio da história, já considerávamos primos. O uso de palavras tipicamente alentejanas que há muito não ouvíamos ou que desconhecíamos por completo fazia-nos rir à gargalhada, e não deixávamos de confirmar uma e outra vez que ela era irmã do nosso pai pois para contar qualquer coisa da infância lá na terra ela recuava até às Invasões Francesas.
Como irmã mais velha duma prole de sete filhos onde o meu pai ocupa o lugar do mais novo, era delirante ouvi-la chamar a um homem de sessenta anos, o meu caçula. Durante muitos anos brincávamos com a existência da Gazeta, que correspondia à rede telefónica de informações da qual a minha mãe também participava e que dava notícias sobre aniversários da família – coisa que a Tia Josefa tinha na ponta da língua desde os irmãos até aos netos dos irmãos e que nós nunca sabíamos – passando por doenças em primeira mão e respectivas curas!
A Tia Josefa tinha sempre, mas sempre, uma nota para nos dar que nos arrancava um sorriso de agradecimento, mas na verdade era ela quem a merecia, como pagamento daqueles momentos inesquecíveis, onde não faltava uma visita guiada pelos novos elementos da família através de fotografias que todos fazíamos questão em lhe oferecer, sabendo que ela gostava.
Muitas vezes o meu pai aparecia de surpresa, coisa que antigamente se fazia e que nós não gostávamos, pois se ele telefonasse a avisar que iríamos, sabíamos que a Tia Josefa nos daria aquilo com que salivávamos sempre que falávamos dela: o bolo de chifon! Venham pasteleiros dos quatro cantos do mundo imitar o bolo de chifon se conseguirem!
Tudo isto junto, e muito mais, dá a dimensão da eternidade de certas pessoas.
Apesar dela ser a mais velha, os outros não são propriamente rapazes novos e as cabeças falham cada vez mais: todas as minhas tias foram unânimes em afirmar que eu era a sobrinha mais bonita, mas estava eu a convencer-me disso e a sorrir interiormente com a conquista quando uma delas me disse repetidamente que eu estava muito crescida! Ora tendo em conta que tenho 45 anos, achei por bem não colocar a faixa da mais bela pois a apreciação podia estar um bocadinho deslocada. Só um bocadinho…
Acho que a Tia Josefa nunca se apercebeu da dimensão em que entrava nas nossas conversas, mesmo quando lho dizíamos ela achava que exagerávamos. Mas a verdade é que a árvore mais velha da nossa floresta, com todos os defeitos e virtudes como qualquer um de nós, era uma presença viva e com vida própria. Ainda o é na nossa memória porque há coisas que não se apagam.
O que nos ligava era uma sucessão de momentos únicos que aconteciam sempre que a visitávamos, coisa que durante muitos anos fazíamos com muita frequência pois, se não chegasse o facto de os meus avós viverem com ela, era mais do que suficiente ela ser a mana querida do meu pai, a mana Zefa, dedicação que se entendia também à minha mãe.
A Tia Josefa era doméstica mas o sonho da vida dela era ter sido enfermeira e não havia ocupação que lhe encaixasse melhor. Embora vivesse em Lisboa há séculos nunca perdeu o sotaque alentejano e era com ele que nos contava histórias de antigamente, do meu pai, da família e de pessoas que desconhecíamos mas que, a meio da história, já considerávamos primos. O uso de palavras tipicamente alentejanas que há muito não ouvíamos ou que desconhecíamos por completo fazia-nos rir à gargalhada, e não deixávamos de confirmar uma e outra vez que ela era irmã do nosso pai pois para contar qualquer coisa da infância lá na terra ela recuava até às Invasões Francesas.
Como irmã mais velha duma prole de sete filhos onde o meu pai ocupa o lugar do mais novo, era delirante ouvi-la chamar a um homem de sessenta anos, o meu caçula. Durante muitos anos brincávamos com a existência da Gazeta, que correspondia à rede telefónica de informações da qual a minha mãe também participava e que dava notícias sobre aniversários da família – coisa que a Tia Josefa tinha na ponta da língua desde os irmãos até aos netos dos irmãos e que nós nunca sabíamos – passando por doenças em primeira mão e respectivas curas!
A Tia Josefa tinha sempre, mas sempre, uma nota para nos dar que nos arrancava um sorriso de agradecimento, mas na verdade era ela quem a merecia, como pagamento daqueles momentos inesquecíveis, onde não faltava uma visita guiada pelos novos elementos da família através de fotografias que todos fazíamos questão em lhe oferecer, sabendo que ela gostava.
Muitas vezes o meu pai aparecia de surpresa, coisa que antigamente se fazia e que nós não gostávamos, pois se ele telefonasse a avisar que iríamos, sabíamos que a Tia Josefa nos daria aquilo com que salivávamos sempre que falávamos dela: o bolo de chifon! Venham pasteleiros dos quatro cantos do mundo imitar o bolo de chifon se conseguirem!
Tudo isto junto, e muito mais, dá a dimensão da eternidade de certas pessoas.
Apesar dela ser a mais velha, os outros não são propriamente rapazes novos e as cabeças falham cada vez mais: todas as minhas tias foram unânimes em afirmar que eu era a sobrinha mais bonita, mas estava eu a convencer-me disso e a sorrir interiormente com a conquista quando uma delas me disse repetidamente que eu estava muito crescida! Ora tendo em conta que tenho 45 anos, achei por bem não colocar a faixa da mais bela pois a apreciação podia estar um bocadinho deslocada. Só um bocadinho…
Acho que a Tia Josefa nunca se apercebeu da dimensão em que entrava nas nossas conversas, mesmo quando lho dizíamos ela achava que exagerávamos. Mas a verdade é que a árvore mais velha da nossa floresta, com todos os defeitos e virtudes como qualquer um de nós, era uma presença viva e com vida própria. Ainda o é na nossa memória porque há coisas que não se apagam.
Tenho uma enorme admiração pelos alentejanos. Tem um humor que é só deles. São combativos e senhores do seu nariz. Porque é que o Partido Comunista Português teve a sua implantação no Alentejo desde a sua criação nos anos 40 do século passado? Por causa do temperamento dos alentejanos. Sempre considerei os nortenhos mais submissos, mas sim patrão, pois claro patrão, é assim mesmo patrão, não, não, paga quando puder. São gente de fibra. A minha cidade de eleição? Évora. Já lá fui bastantes vezes e não me canso de lá passar sempre que posso. Pela cidade e pelas pessoas.Ainda este ano lá estive. Há coisas que eu quero que as minhas filhas conheçam. Évora era uma cidade que eu queria que elas visitassem. Claro que não lhes dão, ainda, o devido valor. Mas para já sabem onde fica.
ResponderEliminarPela sua tia Josefa, os meus pêsames.