sexta-feira, 8 de março de 2013

Tack, Stieg Larsson


De empreitada li os três livros de Stieg Larsson, a trilogia Millenium. Adorei o primeiro, Os homens que odeiam as mulheres, gostei bastante dos outros, A rapariga que sonhava com uma lata de gasolina e um fósforo e A rainha no palácio das correntes de ar. A construção de Lisbeth Salander é extraordinária e Mikael Blomqvist é um precioso acessório.
A trilogia – de Editora Oceanos, Grupo Leya - está gralhada mas o enredo é tão bom que fui saltando sem demoras até ao fim. Livros difíceis de ler no Metro, por causa do volume e do peso, só lia à noite e, chegada à meta, não deixo de pôr um ponto de interrogação ao pensar no ataque cardíaco que deu ao autor. Que estranho.
A páginas tantas já os, para nós, bizarros nomes de povoações e pessoas me pareciam naturais e lia-os como estavam escritos sem engolir letras e sílabas como costumamos fazer quando os nomes são complicados.
Tudo assenta na perfeição, o mal extremo a enviuzar-se pela vida das pessoas normais e as pessoas que podiam ser normais a criarem mundos herméticos e cerrados onde nem o oxigénio entra.
Polícia contra polícia, jornalistas ciosos de verdade e justiça, a vingança a passear-se como quem se oferece e a ser agarrada e usada. E a dar prazer. E que prazer.
Depois da leitura decidi-me a ver os filmes. A surpresa foi total. Pela primeira vez senti que um filme fazia jus a um livro. A multiplicar por três.
Longe dos cabeleireiros de Hollywood há pessoas e não personagens. Pessoas completamente desconhecidas, na medida em que não lhes reconheço a cara fruto da minha ignorância sobre cinema sueco, mas conhecidas na medida em que já sabia tudo sobre elas com a leitura dos livros.
Não vi o filme com o belo Daniel Craig na pele de Blomqvist mas antes as versões suecas onde o jornalista é um tipo que já sofreu de bexigas e tem as marcas na cara, veste camisolas de mangas compridas meias tortas e fatos de treino sem qualquer estilo, bem ao estilo de uma pessoa com aquelas características. Não há cá as camisas brancas bem passadas a ferro que Craig usava no pouco que vi na apresentação do filme americano.
Erika Berger anda permanente e naturalmente despenteada e sem brilho mas com uma veracidade que não via há anos, ao contrário da sua colega americana que tem o verniz de Hollywood, cujo cheiro se sente a léguas. Erika mostra um pequeno pneu na cintura e umas cuecas de gola alta que lhe tapam a barriguinha maior do que os critérios de Hollywood algum dia permitiriam. É real, é verdadeira, é uma mulher e não uma boneca construída para aquela situação.
Todos os personagens têm defeitos, o que lhes dá uma credibilidade enorme. Mikael Blomqvist é muito namoradeiro e relaciona-se com meia dúzia de mulheres ao longo de toda a narrativa, mas as cenas de sexo não foram exploradas nos filmes, surgindo qb de forma natural e espontânea, ao longo de várias horas, que não se tornam longas, embora cada filme seja bem maior do que aquilo a que estamos habituados.
Lisbeth Salander é maravilhosa e o seu comportamento chega a causar inveja num mundo cobarde e cínico, hipócrita e desleal como este em que vivemos.
A caracterização da personagem é um espanto e está de tal modo bem-feita que se continua sempre a ver a pessoa por baixo da maquilhagem, do gel e da laca. Noomi Rapace é brilhante, extraordinária e usa o olhar para nos manter à distância num trabalho de interpretação único.
Livros cinco estrelas, filmes cinco estrelas, coisa rara, raríssima. 

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