Os meus sobrinhos vivem numa barraquita com três
andares. O primeiro conjuga a cozinha, a sala, uma casa de banho e um terraço,
que dá pelo nome de pátio; no do meio ficam os quartos e duas casas de banho, no
terceiro há um mega sótão, a que chamamos O Espaço, e que tem um escritório, uma
sala, duas camas, biblioteca, zona de brincar, área para passar a ferro, entre
outras valências.
A minha casa é parecida na medida em que também tem
cozinha, casa de banho, e dois quartos, mas cabe tudo na sala deles.
Sempre que os miúdos me visitam – e vieram este fim-de-semana
– digo-lhes que tenham atenção porque nos prédios normais, ao contrário do prédio
deles, moram outras pessoas, aquilo a que se chama vizinho, e devemos ter em
atenção para não fazermos muito barulho.
A minha sobrinha é uma ajudante maravilhosa – ele é
mais técnico de televisão, ficando a mudar de canal indefinidamente, suponho
que para confirmar que funcionam todos… - e ajudou-me nas compras, a arrumá-las,
a estender roupa, a fazer mil coisas.
Ao fim do dia de ontem foram embora para casa dos
avós, deixando-me sozinha e a fazer contas aos minutos que faltam para passar
esta última semana de trabalho antes das férias, quando nos juntaremos.
Já sozinha dediquei-me a mais algumas, poucas,
arrumações e estive a ver um filme. Depois do jantar, ainda de dia, decidi dar
uma volta a pé e procurei uns chinelos que uso para este fim, quando a volta é
curta. Procurei, procurei, procurei, mas não encontrei. Às tantas decidi
telefonar-lhes a perguntar onde é que a garota tinha posto os chinelos, que me
lembrava de lhe ter pedido para arrumar.
- Lá fora Quica, onde tu pediste que eu os pusesse.
- Mas lá fora já eu vi e não os encontro, estão lá
os ténis, as sandálias, as botas, mas os chinelos não.
- Não Quica, lá fora não está nada disso, só lá ficaram os chinelos!
- Não Quica, lá fora não está nada disso, só lá ficaram os chinelos!
- Mas se eu estou aqui e estou a ver tudo isto de
sapatos, como é que tu dizes que só cá ficaram os chinelos?
- Mas oh Quica, tu estás em que lá fora?
- O quê? Em que lá fora? Não percebo nada…
- Sim, tu só tens um lá fora que é depois da porta
da rua, na escada, abre lá a porta que dá para a escada.
A meio desta frase já eu me dirigia para a porta,
que abri. Ao cantinho, um por cima do outro, ao lado do tapete, estavam os
chinelos. Baixei-me, apanhei-os e a rir continei a falar com ela:
- Então tu
puseste os chinelos na rua? Era na marquise do meu quarto!
- Quica, isso não é lá fora, é dentro! Eu bem te
disse que tu só tens esse lá fora! Nós
temos o pátio, as varandas e o hall de entrada por fora da porta, e eu
perguntei duas vezes e tu disseste que sim, que era lá fora, por isso eu fiz o
que tu pediste.
Despedimo-nos a rir, comigo a lembrar-me que esta é
a miúda que, com quatro ou cinco anos, quando a professora disse que ela podia
levar uma coisa em cada mão, ela corrigiu-a dizendo que podia levar mais pois para
além das mãos, ela tinha dois debaixo dos braços…
Estes miúdos assim vão longe. E já me ri com o "em que lá fora?". Não há nada mais importante do que a precisão dos conceitos, evita equívocos :)
ResponderEliminarIvone, concordo consigo, mas graças aos equívocos (meus, não deles!), farto-me sempre de rir...
ResponderEliminarEsses por companhia é uma viagem de aventuras. E tu para eles deves ser um pouco mais ou menos que lâmpada de Aladino ou um tapete voador.
ResponderEliminarBabas-me com essas afirmações. A verdade é que os momentos felizes se multiplicam quando estamos juntos, como se nem precisássemos de falar. É inexplicável.
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