sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

O Último Bandeirante

Gosto muito de romance histórico, e este tem a particularidade de ter uma boa construção de personagens, elemento essencial para qualquer narrativa, mas ainda mais neste tipo de literatura onde, com frequência, há autores que se abrigam nas descrições da época fragilizando as personagens, conferindo-lhes um estatuto de fantasma, tal a fragilidade com que nos aparecem.
Não me canso de elogiar um livro que me convença através deste aspecto: quando lemos e ‘reconhecemos’ as acções ou os pensamentos, é como se conhecêssemos aquela pessoa. Isto é trabalho do Autor, enquanto pai, escultor que não despreza mínimos detalhes que ajudam a fazer o puzzle das personagens.
Por outro lado, o Autor não toma posição a favor de bandeirantes ou missionários: dá-nos a dimensão dos factos históricos, riquíssimos, como quem mostra uma fotografia. Dá-nos a informação mas sem opiniões, sem julgamentos, nem o poderia fazer sem insultar a História.
Nunca escrevi nada que roçasse sequer o romance histórico mas até acredito haver uma certa tentação para, no mínimo, se usarem adjectivos que acusem o nosso ponto de vista, palavras traiçoeiras que façam os outros perceber que concordamos com isto mas não com aquilo ou, pior ainda, muito pior, quando se analisam as situações e se fazem reflexões à luz dos nossos dias, em total disparate.
‘O Último Bandeirante’ não tem disparates, antes pelo contrário: narra o que aconteceu, como cronista, usando a imaginação mas sem desmerecer na História, sem a querer alterar.
Introduz-nos o mundo meio conquistado meio por conquistar do imenso continente sul-americano, com descrições da selva e das Missões, dos escravos, da dinâmica das bandeiras e lembra-nos a maior bandeira de sempre, uma epopeia de cerca de 12 mil quilómetros no meio dum inferno, mas realizada, empreendida por muitos e concluída apenas por meia dúzia, por um punhado de gente que regressou obrigatoriamente diferente, como o Autor nos dá conta.
A descrição do assalto à Missão chega a ser bela, por incrível que pareça, apesar dos horrores enunciados, por verídica nos parecer.
‘O Último Bandeirante’ é um livro extremamente visual: das paisagens, dos índios, dos rios, dos mapas, mas também das personagens, da História, do passado, um passado que se fez presente e que está presente nos nomes das províncias, dos cursos de água, dos animais ou das frutas.

Confesso que sou desconfiada de jornalistas-escritores: a minha primeira impressão vai para um interesse comercial das Editoras em publicarem ‘famosos’, o que se espera vir a ser uma mais-valia nas vendas. É o fenómeno, ‘figura pública mediática ou mediatizada por qualquer razão que nada contribui para a tornar escritora, mas que mesmo assim atiça a curiosidade do público e isso chega’. Neste contexto, o jogador de futebol, leva a palma de ouro.
Por outro lado, custa-me a interiorizar, custa-me muito…, que certos jornalistas tenham escrito certas coisas e é com imensa facilidade que a minha imaginação vê outros a escreverem por eles, mas a minha imaginação é muito fantasiosa… Desta vez não foi o caso.
O livro é do jornalista Pedro Pinto, editado pela Esfera dos Livros, tem badanas, e na capa mostra uma imagem do quadro A primeira missa no Brasil, de Victor Meirelles.

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