A minha amiga I. foi de férias e trouxe-me, entre outras coisas, uma caixa de bolos, supostamente muito famosos. Nunca tinha ouvido falar deles e acho que o nome dos bolos é conhecido à semelhança do meu próprio nome no seio da minha família, que o mesmo é dizer, dentro de portas todos me conhecem, estranho seria o contrário. Porém, ela lá ouviu falar e resolveu trazê-los. Ora, felizmente, eu não sou muito dada à guloseima e dividi os doces por colegas de trabalho que os engoliam como se fossem vidreiros numa fábrica desconhecida e, de repente, se vissem a moldar por sopro em Murano! Disse-lhes que não precisavam de exagerar a qualificar o sabor dos bolinhos, e eles fizeram uma cara de relaxamento, engolindo as últimas migalhas.
Isto aconteceu ontem e o nome dos bolos não o guardei nem por dois minutos, o que pode levar a pensar que desprezei a oferta, que nem consumi.
Nada disso.
Guardei a caixa, de cartão grosso, azul celeste, com uma tampa bordada com uma borboleta e que vai ficar para sempre na minha gaveta dos brincos e demais acessórios de enfeitamento. Sempre que abrir a gaveta vou vê-la e lembrar os bolos e o meu desconhecimento da indústria pasteleira parisiense, mas acima de tudo, vou lembrar-me da I. que proporcionou aquela presença num local inacessível aos olhares alheios, mas diariamente rebuscada por mim, usada por mim.
Não aprecio presentes que se consomem, como bolos ou garrafas seja do que for, porque depois de consumidos, desaparece a lembrança da oferta, desaparece o rasto do gesto, desaparece a própria intenção, desaparece a memória.
No meio da minha eterna – e essa sim, famosa – desarrumação, há coisas que ninguém sabe o que são, mas eu sei, e sei de onde vieram, quem mas deu e em que circunstâncias foram parar lá a casa e ali, àquele sítio.
O pior é quando nos oferecem alguma coisa que não gostamos, por vezes, que detestamos mesmo! Cria-se um constrangimento e inventam-se desculpas a dizer que já temos, que nos deram um igualzinho, enfim, inventa-se. Na medida do possível, sou franca e tento dar a volta a dizer que noutra cor é que ficava bem e se não se importam que troque a oferta. Também tenho algumas coisas que foi impossível recusar ou trocar e por lá andam. Também já recebi presentes que voltei a embrulhar e voltei a oferecer, tentando não fazer como na história da gravata que foi oferecida a alguém que, não gostando dela, a guardou para a oferecer posteriormente, mas o tempo passou e tendo-se esquecido quem lha tinha oferecido, foi dá-la precisamente a essa pessoa, que logo a reconheceu...
Serve isto tudo para agradecer a caixinha de cartão, que tão bem fica na minha gaveta e que, independentemente do tamanho, cabe lá uma amizade gigantesca.
terça-feira, 20 de julho de 2010
Cama de rede
A minha amiga L., em viagem de trabalho pelo Brasil, um certo dia antes dum jantar de cerimónia usou o serviço de cabeleireiro do hotel. Tinha andado o dia todo nas compras e de entre várias coisas, estava muito satisfeita com uma cama de rede que comprara, meia rendada, uma peça lindíssima. No cabeleireiro foi atendida por uma jovem cabeleireira simpaticíssima que lhe perguntou o que queria fazer, ela e uma colega que a acompanhava. Lá explicaram o que pretendiam, lavaram as cabeças e estava a L. relaxada na cadeira a levar com os primeiros vapores quentes do secador para tirar o excesso da água quando a cabeleireira lhe pergunta:
- Já fizeram amor aqui no Brasil?
Ora, a L. e a colega tinham estado a noite inteira a rir com a televisão bem alta para evitarem ouvir as manifestações de prazer do casal do quarto ao lado e ainda não estavam refeitas da noite de gargalhada, logo, quando ouviram a pergunta, desataram a rir até mais não poderem e responderam à cabeleireira que não. A jovem disse-lhes então que tinham que experimentar fazê-lo numa cama de rede. É claro que se lembraram logo da compra dessa tarde e tiveram novo ataque de riso, de tal forma grande que a cabeleireira pensou não poder continuar a trabalhar com clientes que não paravam quietas e se balançavam rindo à gargalhada.
Lá deram continuidade à conversa e ficaram a saber que a cabeleireira adorava camas de rede mas que, das suas experiências, só não gostava de as usar com americanos, que lhe causavam grandes frustrações porque eram muito grandes e não sabiam manter-se em cima da rede, caindo com frequência, o que, para a acção específica em si, até podia ser perigoso, sendo obviamente doloroso!
A L. e a colega não conseguiam parar de rir e ficaram assombradas quando a cabeleireira lhes contou com pormenores escaldantes como fazer amor numa cama de rede. Entretanto ia pondo ganchos que seguravam os longos cabelos da L. para secar as partes mais perto do pescoço e ia subindo com o secador à medida que o trabalho caminhava para o fim, puxando o cabelo com a escova, pondo mais um rolo, substituindo esta escova por aquela, mais apropriada a esta parte do cabelo, tufando um pouco em cima, alisando e enrolando nas pontas, tudo enquanto dava uma aula sapiente e descritiva, não só como fazer amor numa cama de rede, mas e principalmente, como se equilibrar na dita durante o acto!
Por fim, quando a profissional do cabelo se afastou em busca da laca final, a L. perdida de riso, voltou-se para a colega e pediu-lhe que lhe visse bem o cabelo e o que estava a cabeleireira a fazer, pois com toda aquela conversa temia que no fim, ao olhar-se ao espelho, tivesse uma qualquer arquitectura ousada e explícita no alto da cabeça!
A outra chorava e as lágrimas que lhe corriam pela cara não a deixavam ver nada, nem sequer abrir a boca.
E foi com estes ensinamentos que as duas saíram do cabeleireiro e se foram vestir para o jantar.
A cama de rede está na casa da L. mas consta que ainda não foi utilizada.
- Já fizeram amor aqui no Brasil?
Ora, a L. e a colega tinham estado a noite inteira a rir com a televisão bem alta para evitarem ouvir as manifestações de prazer do casal do quarto ao lado e ainda não estavam refeitas da noite de gargalhada, logo, quando ouviram a pergunta, desataram a rir até mais não poderem e responderam à cabeleireira que não. A jovem disse-lhes então que tinham que experimentar fazê-lo numa cama de rede. É claro que se lembraram logo da compra dessa tarde e tiveram novo ataque de riso, de tal forma grande que a cabeleireira pensou não poder continuar a trabalhar com clientes que não paravam quietas e se balançavam rindo à gargalhada.
Lá deram continuidade à conversa e ficaram a saber que a cabeleireira adorava camas de rede mas que, das suas experiências, só não gostava de as usar com americanos, que lhe causavam grandes frustrações porque eram muito grandes e não sabiam manter-se em cima da rede, caindo com frequência, o que, para a acção específica em si, até podia ser perigoso, sendo obviamente doloroso!
A L. e a colega não conseguiam parar de rir e ficaram assombradas quando a cabeleireira lhes contou com pormenores escaldantes como fazer amor numa cama de rede. Entretanto ia pondo ganchos que seguravam os longos cabelos da L. para secar as partes mais perto do pescoço e ia subindo com o secador à medida que o trabalho caminhava para o fim, puxando o cabelo com a escova, pondo mais um rolo, substituindo esta escova por aquela, mais apropriada a esta parte do cabelo, tufando um pouco em cima, alisando e enrolando nas pontas, tudo enquanto dava uma aula sapiente e descritiva, não só como fazer amor numa cama de rede, mas e principalmente, como se equilibrar na dita durante o acto!
Por fim, quando a profissional do cabelo se afastou em busca da laca final, a L. perdida de riso, voltou-se para a colega e pediu-lhe que lhe visse bem o cabelo e o que estava a cabeleireira a fazer, pois com toda aquela conversa temia que no fim, ao olhar-se ao espelho, tivesse uma qualquer arquitectura ousada e explícita no alto da cabeça!
A outra chorava e as lágrimas que lhe corriam pela cara não a deixavam ver nada, nem sequer abrir a boca.
E foi com estes ensinamentos que as duas saíram do cabeleireiro e se foram vestir para o jantar.
A cama de rede está na casa da L. mas consta que ainda não foi utilizada.
Amazónia humana
O metro vai cheio. Como o apanho na primeira estação vou sempre sentada. Umas paragens adiante com o entra e sai de passageiros, senta-se um rapaz ao meu lado com cerca de vinte e cinco anos. Reparo nele porque tem uma t-shirt igual a uma do meu filho, verde bandeira com umas letras no peito. O rapaz já vinha no metro há algum tempo mas só quando se sentou é que vi que as calças de ganga que trazia vestidas tinham uns rasgões nas pernas, tal como algumas do meu filho. Porém, a diferença que se fazia ver, era enorme: dos buracos nas calças saiam uns tufos enormes de pelos, negros, pontiagudos, muitos! Parecia que o rapaz tinha um canavial plantado na perna esquerda.
Não era só eu que lhe mirava as pernas, várias pessoas tinham os olhos colados na abertura – que provavelmente fez com que as calças fossem mais caras! – de onde saia aquele arbusto fulgurante. O rapaz levava uns auscultadores enormes na cabeça, que abanava ligeiramente ao som da música, que eu conseguia ouvir perfeitamente e parecia não dar conta que era o protagonista daquela viagem de metro, como se fosse ali uma árvore cujo ramo abanava diante dos olhares meios gozões, meios de surpresa.
A tomar como exemplo aquela singela abertura ele devia ser uma espécie de Amazónia humana, o que me lembrou um actor brasileiro conhecido pelo seu aspecto peludo, como se usasse um tapete de pelúcia de pelo comprido, a cobrir-lhe o corpo.
Se o meu companheiro de viagem fizesse a depilação devia perder uns dois ou três quilos, garantidamente!
Não era só eu que lhe mirava as pernas, várias pessoas tinham os olhos colados na abertura – que provavelmente fez com que as calças fossem mais caras! – de onde saia aquele arbusto fulgurante. O rapaz levava uns auscultadores enormes na cabeça, que abanava ligeiramente ao som da música, que eu conseguia ouvir perfeitamente e parecia não dar conta que era o protagonista daquela viagem de metro, como se fosse ali uma árvore cujo ramo abanava diante dos olhares meios gozões, meios de surpresa.
A tomar como exemplo aquela singela abertura ele devia ser uma espécie de Amazónia humana, o que me lembrou um actor brasileiro conhecido pelo seu aspecto peludo, como se usasse um tapete de pelúcia de pelo comprido, a cobrir-lhe o corpo.
Se o meu companheiro de viagem fizesse a depilação devia perder uns dois ou três quilos, garantidamente!
segunda-feira, 19 de julho de 2010
Mastercard
A publicidade do Mastercard é ridícula.
Há dois outdoors um com uma figura masculina e outro com uma feminina. O primeiro alude ao cabedal e tem um ginásio como pano de fundo; o segundo, com um avião a sorrir-nos, alude a férias, ao descanso e ao prazer. Ambos querem fazer-nos pensar na liberdade que nos é dada com o dito cartão e eu nem discutiria mais uma campanha de oferta de dinheiro fácil, não fosse a frase, magistral, que acompanha os dois cartazes: ‘Saber que há coisas que são só portuguesas não tem preço’.
Porquê? Como? Quando?
Aguardo uma explicação convincente.
Há dois outdoors um com uma figura masculina e outro com uma feminina. O primeiro alude ao cabedal e tem um ginásio como pano de fundo; o segundo, com um avião a sorrir-nos, alude a férias, ao descanso e ao prazer. Ambos querem fazer-nos pensar na liberdade que nos é dada com o dito cartão e eu nem discutiria mais uma campanha de oferta de dinheiro fácil, não fosse a frase, magistral, que acompanha os dois cartazes: ‘Saber que há coisas que são só portuguesas não tem preço’.
Porquê? Como? Quando?
Aguardo uma explicação convincente.
Mãe, precisa-se!
Estou deitada na areia a ler. Levanto os olhos à passagem de três adultos que vêm da água e me salpicam.
Param a três metros de mim e uma das mulheres pergunta:
- A Rita? Onde está a Rita?
- Não sei, ela não tinha ficado aqui?
- Não! Ela foi atrás de ti para a água!
- Ai a minha filha, a minha filha!
Todas as pessoas ali ao redor se levantam e começam a olhar para todos os lados, na esperança de ver uma garota algures a chorar ou com ar de perdida, sinais prováveis de ser a Rita. Mas ninguém vê nada.
A mãe fica ao lado do chapéu de sol a chorar e a chamar pela filha e os outros dois, um homem e a uma mulher, avançam pela areia em direcção ao mar.
Só nesta altura me apercebo que debaixo do chapéu de sol dorme uma criança, com uma ano e tal, dois anos, ou seja, para além de não saberem da Rita, foram à água e deixaram uma criança SOZINHA a cerca de cem metros da água, encostada à parede da praia, o local mais longe da água. Cem metros que, para uma criança daquela idade, que acordasse e se visse sozinha, correspondiam a quilómetros quadrados de medo, de pânico e de choro.
Adiantando a descrição, passados cinco minutos, que confesso me pareceram a mim e a todos os que estavam a assistir àquele filme a cinco anos, lá vem a Rita, meia a chorar, com o homem atrás a dizer-lhe que não se devia afastar! A mãe, sentada na areia ao lado do gaiato que dormia, chora desalmadamente mas, quando vê a filha e se espera que a abrace, não o faz. Abraça-se à outra mulher, a chorar convulsivamente, deixando a criança ali a seu lado com medo, assustada e só. Quando largou os ombros da outra e se lhe secaram as lágrimas deu uma desanca na miúda porque tinha desaparecido.
Não aguentei mais e disse alto e bom som que não suporto pessoas estúpidas e fui à água.
Numa praia cheia de gente não se tira os olhos das crianças, não se espera que elas reajam como adultos porque não são. Somos nós que as perdemos e não as crianças que se perdem.
Aquela mãe centrou em si a angústia de sentir o desaparecimento da filha, mas não se regozijou por a encontrar, não a puxou para si, não a abraçou, não lhe disse o quanto a amava e o quão desesperada estava por a saber sozinha no meio de milhares de pessoas. Não, aquela mãe pensou nela própria e nada mais. Aquela mãe, que vai à água e deixa uma criança pequena abandonada debaixo dum chapéu de sol, longe da água, que perde outra filha, pode ter sido mãe duas vezes, talvez até mais, mas não é mãe do coração de nenhuma daquelas crianças.
Param a três metros de mim e uma das mulheres pergunta:
- A Rita? Onde está a Rita?
- Não sei, ela não tinha ficado aqui?
- Não! Ela foi atrás de ti para a água!
- Ai a minha filha, a minha filha!
Todas as pessoas ali ao redor se levantam e começam a olhar para todos os lados, na esperança de ver uma garota algures a chorar ou com ar de perdida, sinais prováveis de ser a Rita. Mas ninguém vê nada.
A mãe fica ao lado do chapéu de sol a chorar e a chamar pela filha e os outros dois, um homem e a uma mulher, avançam pela areia em direcção ao mar.
Só nesta altura me apercebo que debaixo do chapéu de sol dorme uma criança, com uma ano e tal, dois anos, ou seja, para além de não saberem da Rita, foram à água e deixaram uma criança SOZINHA a cerca de cem metros da água, encostada à parede da praia, o local mais longe da água. Cem metros que, para uma criança daquela idade, que acordasse e se visse sozinha, correspondiam a quilómetros quadrados de medo, de pânico e de choro.
Adiantando a descrição, passados cinco minutos, que confesso me pareceram a mim e a todos os que estavam a assistir àquele filme a cinco anos, lá vem a Rita, meia a chorar, com o homem atrás a dizer-lhe que não se devia afastar! A mãe, sentada na areia ao lado do gaiato que dormia, chora desalmadamente mas, quando vê a filha e se espera que a abrace, não o faz. Abraça-se à outra mulher, a chorar convulsivamente, deixando a criança ali a seu lado com medo, assustada e só. Quando largou os ombros da outra e se lhe secaram as lágrimas deu uma desanca na miúda porque tinha desaparecido.
Não aguentei mais e disse alto e bom som que não suporto pessoas estúpidas e fui à água.
Numa praia cheia de gente não se tira os olhos das crianças, não se espera que elas reajam como adultos porque não são. Somos nós que as perdemos e não as crianças que se perdem.
Aquela mãe centrou em si a angústia de sentir o desaparecimento da filha, mas não se regozijou por a encontrar, não a puxou para si, não a abraçou, não lhe disse o quanto a amava e o quão desesperada estava por a saber sozinha no meio de milhares de pessoas. Não, aquela mãe pensou nela própria e nada mais. Aquela mãe, que vai à água e deixa uma criança pequena abandonada debaixo dum chapéu de sol, longe da água, que perde outra filha, pode ter sido mãe duas vezes, talvez até mais, mas não é mãe do coração de nenhuma daquelas crianças.
Praia do Tamariz: de fugir!
Praia do Tamariz, sábado, depois do almoço.
Estou sentada na areia a olhar o mar. Passa um casal de adolescentes, ele branco ela preta. Passeiam de mãos dadas, pés dentro de água, partilham segredos que os fazem sorrir.
Passado um bocado vejo-os caminhar com a mesma cumplicidade, na direcção oposta.
Um grupo de cerca de 15 a 20 jovens, brancos e pretos, provoca o rapaz:
- A preta é boa, é?
A resposta veio com intenção de pôr um fim à conversa:
- Mete-te na tua vida!
Uns segundos depois o rapaz estava tapado por vários membros do grupo que se tinham levantado como molas e o obrigavam a dobrar enquanto lhe torciam os braços e o pescoço.
A rapariga chorava e gritava:
- Não, não, deixem-no!
Tentava meter os braços no meio daquela pequena multidão a puxar o namorado, sem sucesso, restando-lhe chorar e implorar que o largassem.
Uma mulher sentada a meu lado e igualmente a ver a cena alertou a polícia que estava em cima do paredão. Os agentes começaram a andar lentamente e um dos do grupo, que sempre se mantivera à parte da algazarra, aproximou-se dos amigos e disse com voz firme:
- Deixem-no! Isto está a ficar cheio de fruta e não quero sarilhos. Nós depois apanhamo-lo...
Foi uma ordem. E ordens são para cumprir. O mais impressionante de tudo é que a ordem foi dada por aquele que parecia ser o líder do grupo, sendo que era um gaiato que não tinha mais que 13 ou 14 anos.
Libertaram o rapaz que se agarrou ao pescoço magoado e continuou a andar com a rapariga que não sustinha as lágrimas.
Desapareceram do meu campo de visão em minutos.
A turba manteve-se.
Praia do Tamariz, sábado seguinte, depois de almoço.
Um grupo de adolescentes brancos e pretos gritam, dizem impropérios às toneladas uns aos outros, atiram areia a todos quantos ali estão, correm sem se preocuparem seja com quem for.
Estou deitada de barriga para baixo a ler e de repente ouço:
- Algema já esse!
Levanto os olhos e diante de mim estão seis agentes, dois deles com cães, e quatro adolescentes algemados, deitados no chão a lamber areia.
A aproximação foi tão rápida e subtil que ninguém deu conta de chegarem.
Um dos agentes questiona outro se esta a ver ‘o que falta’; o outro responde que sim, que está dentro de água mas que o está a ver.
Aproximam-se várias raparigas que vêm da água e perguntam aquilo que todos os que estão a assistir querem saber também:
- O que aconteceu?
- Estes indivíduos foram identificados por três rapazes que assaltaram no comboio hoje de manhã. Afastem-se, não mexam em nada porque temos que encontrar a arma branca que usaram para ameaçar durante o assalto.
As raparigas ainda tentaram aproximar-se do monte de toalhas, mochilas e roupa mas os agentes foram firmes e não permitiram.
Enquanto isso, o jovem branco que estava igualmente algemado foi tomado por um ataque inusitado de vontade de rir e, fazendo força com o pescoço para não ter a cara na areia, ria-se como se estivesse a ver um filme cómico. O gozo foi travado por um dos agentes que lhe perguntou com voz de trovão o que lhe dava vontade de rir, não obtendo resposta, mas fazendo com que a atitude provocatória terminasse.
Os agentes remexeram nas mochilas dos algemados e passados minutos levantaram-nos do chão e levaram-nos até a uma carrinha da polícia estacionada no paredão ao lado da areia, juntamente com os seus pertences.
Assim que viraram costas, uma das raparigas tornou-se um vulcão de impropérios, acusando-os de racismo e berrando literalmente os maiores disparates possíveis. Os pedidos das outras para que se calasse não obtiveram qualquer eco.
A praia estava sentada ou de pé, aguardando o desfecho e rezando em uníssono que alguém tivesse coragem de dar um sopapo na rapariga de forma a calá-la.
Só se silenciou quando dois dos agentes voltaram à areia para prender o elemento que tinha estado dentro de água e, aparentemente, não tinha dado conta do que se estava a passar. Aproximaram-se novamente do grupo e pediram repetidamente que lhes dissessem onde estava a arma branca e o telemóvel do suspeito. Ninguém sabia. os agentes perguntaram onde os tinham enterrado e o grupo, quase só raparigas, respondeu que não sabiam de nada. os agentes voltaram ao paredão e regressaram à areia com um dos rapazes algemados, que pediu ao grupo, em voz baixa, que dessem as suas coisas à polícia, numa atitude que foi interpretada pela assistência como de confissão. O grupo não se mexeu.
Levaram o rapaz novamente o que provocou nova ira do vulcão que despejou lava ardente pela praia inteira, num festival que devia estar a ser ouvido nas praias das imediações.
A maioria das pessoas começou a fechar os chapéus de sol, a sacudir a areia e a vestir-se. Eu fiz o mesmo.
Ontem, Domingo, fui para a praia de S. Pedro.
Estou sentada na areia a olhar o mar. Passa um casal de adolescentes, ele branco ela preta. Passeiam de mãos dadas, pés dentro de água, partilham segredos que os fazem sorrir.
Passado um bocado vejo-os caminhar com a mesma cumplicidade, na direcção oposta.
Um grupo de cerca de 15 a 20 jovens, brancos e pretos, provoca o rapaz:
- A preta é boa, é?
A resposta veio com intenção de pôr um fim à conversa:
- Mete-te na tua vida!
Uns segundos depois o rapaz estava tapado por vários membros do grupo que se tinham levantado como molas e o obrigavam a dobrar enquanto lhe torciam os braços e o pescoço.
A rapariga chorava e gritava:
- Não, não, deixem-no!
Tentava meter os braços no meio daquela pequena multidão a puxar o namorado, sem sucesso, restando-lhe chorar e implorar que o largassem.
Uma mulher sentada a meu lado e igualmente a ver a cena alertou a polícia que estava em cima do paredão. Os agentes começaram a andar lentamente e um dos do grupo, que sempre se mantivera à parte da algazarra, aproximou-se dos amigos e disse com voz firme:
- Deixem-no! Isto está a ficar cheio de fruta e não quero sarilhos. Nós depois apanhamo-lo...
Foi uma ordem. E ordens são para cumprir. O mais impressionante de tudo é que a ordem foi dada por aquele que parecia ser o líder do grupo, sendo que era um gaiato que não tinha mais que 13 ou 14 anos.
Libertaram o rapaz que se agarrou ao pescoço magoado e continuou a andar com a rapariga que não sustinha as lágrimas.
Desapareceram do meu campo de visão em minutos.
A turba manteve-se.
Praia do Tamariz, sábado seguinte, depois de almoço.
Um grupo de adolescentes brancos e pretos gritam, dizem impropérios às toneladas uns aos outros, atiram areia a todos quantos ali estão, correm sem se preocuparem seja com quem for.
Estou deitada de barriga para baixo a ler e de repente ouço:
- Algema já esse!
Levanto os olhos e diante de mim estão seis agentes, dois deles com cães, e quatro adolescentes algemados, deitados no chão a lamber areia.
A aproximação foi tão rápida e subtil que ninguém deu conta de chegarem.
Um dos agentes questiona outro se esta a ver ‘o que falta’; o outro responde que sim, que está dentro de água mas que o está a ver.
Aproximam-se várias raparigas que vêm da água e perguntam aquilo que todos os que estão a assistir querem saber também:
- O que aconteceu?
- Estes indivíduos foram identificados por três rapazes que assaltaram no comboio hoje de manhã. Afastem-se, não mexam em nada porque temos que encontrar a arma branca que usaram para ameaçar durante o assalto.
As raparigas ainda tentaram aproximar-se do monte de toalhas, mochilas e roupa mas os agentes foram firmes e não permitiram.
Enquanto isso, o jovem branco que estava igualmente algemado foi tomado por um ataque inusitado de vontade de rir e, fazendo força com o pescoço para não ter a cara na areia, ria-se como se estivesse a ver um filme cómico. O gozo foi travado por um dos agentes que lhe perguntou com voz de trovão o que lhe dava vontade de rir, não obtendo resposta, mas fazendo com que a atitude provocatória terminasse.
Os agentes remexeram nas mochilas dos algemados e passados minutos levantaram-nos do chão e levaram-nos até a uma carrinha da polícia estacionada no paredão ao lado da areia, juntamente com os seus pertences.
Assim que viraram costas, uma das raparigas tornou-se um vulcão de impropérios, acusando-os de racismo e berrando literalmente os maiores disparates possíveis. Os pedidos das outras para que se calasse não obtiveram qualquer eco.
A praia estava sentada ou de pé, aguardando o desfecho e rezando em uníssono que alguém tivesse coragem de dar um sopapo na rapariga de forma a calá-la.
Só se silenciou quando dois dos agentes voltaram à areia para prender o elemento que tinha estado dentro de água e, aparentemente, não tinha dado conta do que se estava a passar. Aproximaram-se novamente do grupo e pediram repetidamente que lhes dissessem onde estava a arma branca e o telemóvel do suspeito. Ninguém sabia. os agentes perguntaram onde os tinham enterrado e o grupo, quase só raparigas, respondeu que não sabiam de nada. os agentes voltaram ao paredão e regressaram à areia com um dos rapazes algemados, que pediu ao grupo, em voz baixa, que dessem as suas coisas à polícia, numa atitude que foi interpretada pela assistência como de confissão. O grupo não se mexeu.
Levaram o rapaz novamente o que provocou nova ira do vulcão que despejou lava ardente pela praia inteira, num festival que devia estar a ser ouvido nas praias das imediações.
A maioria das pessoas começou a fechar os chapéus de sol, a sacudir a areia e a vestir-se. Eu fiz o mesmo.
Ontem, Domingo, fui para a praia de S. Pedro.
quinta-feira, 15 de julho de 2010
Eu: grávida e feliz!
Janeiro de 1994, Bruxelas.
Quis ir passar a passagem do ano em Londres mas o meu marido não quis. Passados dias convidou-me a acompanhá-lo a Bruxelas, onde estivéramos mas só de passagem.
Ele ficou os dias inteiros numa sala de formação do hotel, com um grupo de gente vinda de vários locais do mundo. Lembro-me duns mexicanos que, numa manhã em que começou a nevar, saltaram das suas cadeiras e foram buscar as máquinas fotográficas pois nunca tinham visto neve. A formação que esperasse, eu teria feito o mesmo!
Eu saia do hotel depois do pequeno almoço – soberbo, e eu já tomei pequenos almoços em muitos sítios, sei do que falo – e caminhava em Bruxelas ao sabor das curvas das ruas. Tomei imensos cafés e chocolates quentes, dentro dum frio imenso que combatia à força de sorrisos e vontade de conhecer mais esta rua e mais aquela, mas que acabavam sempre na praça central, como não podia deixar de ser.
Caminhava devagar e recolhia ao hotel cedo, primeiro porque ficava de noite perto das cinco da tarde, depois porque estava grávida.
Lembro-me de acariciar a barriga dentro de autocarros e conversar com o meu filho contando-lhe o que estava a ver e descrevendo praças e ruas e museus e fachadas de edifícios. Lembro-me de marcar encontro com ele em certos sítios dentro de vários anos. A marcação mantêm-se, embora ainda tenha que esperar, pois ele está na fase em que quer é sair com os amigos. Mas eu sei que não será em vão... eu sei e certezas de mãe, são coisas poderosas.
Encontrei esta fotografia quando arrumava a carteira, no meio de uma dezena de fotografias do meu filho. Gosto de pensar que esta é a sua primeira fotografia, quando os pais sorriam em simultâneo.
Quis ir passar a passagem do ano em Londres mas o meu marido não quis. Passados dias convidou-me a acompanhá-lo a Bruxelas, onde estivéramos mas só de passagem.
Ele ficou os dias inteiros numa sala de formação do hotel, com um grupo de gente vinda de vários locais do mundo. Lembro-me duns mexicanos que, numa manhã em que começou a nevar, saltaram das suas cadeiras e foram buscar as máquinas fotográficas pois nunca tinham visto neve. A formação que esperasse, eu teria feito o mesmo!
Eu saia do hotel depois do pequeno almoço – soberbo, e eu já tomei pequenos almoços em muitos sítios, sei do que falo – e caminhava em Bruxelas ao sabor das curvas das ruas. Tomei imensos cafés e chocolates quentes, dentro dum frio imenso que combatia à força de sorrisos e vontade de conhecer mais esta rua e mais aquela, mas que acabavam sempre na praça central, como não podia deixar de ser.
Caminhava devagar e recolhia ao hotel cedo, primeiro porque ficava de noite perto das cinco da tarde, depois porque estava grávida.
Lembro-me de acariciar a barriga dentro de autocarros e conversar com o meu filho contando-lhe o que estava a ver e descrevendo praças e ruas e museus e fachadas de edifícios. Lembro-me de marcar encontro com ele em certos sítios dentro de vários anos. A marcação mantêm-se, embora ainda tenha que esperar, pois ele está na fase em que quer é sair com os amigos. Mas eu sei que não será em vão... eu sei e certezas de mãe, são coisas poderosas.
Encontrei esta fotografia quando arrumava a carteira, no meio de uma dezena de fotografias do meu filho. Gosto de pensar que esta é a sua primeira fotografia, quando os pais sorriam em simultâneo.
quarta-feira, 14 de julho de 2010
A malta quer é música!
Num estudo realizado no Centro de Investigação e Estudos de Sociologia (CIES), do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE), sobre a “Linha de Crédito para Estudantes do Ensino Superior com Garantia Mútua” e recentemente anunciado na comunicação social, afirma-se que entre finais de 2007 e Dezembro de 2009 foram pedidos mais de 128 milhões de euros para financiar cursos superiores. Ou seja, as pessoas pagam para providenciar a sua aprendizagem formal superior, para crescerem profissionalmente, para aumentar a sua auto-estima e caminharem num futuro munidas de ferramentas que consideram essenciais. Parece-me um bom investimento, controvérsias à parte sobre a gratuitidade do ensino.
Agora gostava de relacionar esta informação com uma realidade que se vive no calor de Verão em Portugal, num Portugal em crise, com elevados índices de desemprego, com famílias em precárias condições, com empresas a fechar e por aí adiante: os festivais de música!
Desconheço se há valores para quanto se gasta por ano em festivais de música. No site Festivais de Verão encontramos uma lista de 25 nomes de Festivais, alguns com tradição como o Super Bock, Super Rock, Optimus Alive ou Rock in Rio e locais como Paredes de Coura ou Zambujeira do Mar fazem parte obrigatória do trajecto de milhares de pessoas que não vivem sem estes espectáculos.
De acordo com o site os preços vão desde 5 euros a... 3500 euros! Estes são para os lugares VIP Deck do Sensation 2010, no pavilhão Atlântico. No fórum deste festival muitos eram os que se perguntavam se o preço era mesmo aquele e na página do Facebook do festival quando alguém perguntou se ainda havia bilhetes, a organização respondeu que sim, mas que os do Vip Deck estavam a esgotar.
Os 3500 euros contemplam “Mesas exclusivas no VIP Deck; Mesa para 10 pessoas com um serviço inesquecível que inclui: parqueamento automóvel; acesso ao interior do pavilhão por uma entrada exclusiva; encaminhamento por hospedeiras; permanência num espaço exclusivo construído para o efeito, com apenas 16 mesas e vista privilegiada para o espectáculo; 4 garrafas à escolha (champanhe; whisky; vodka ou gin) e ainda refrigerantes diversos.” Mesmo assim, são 350 euros por pessoa e por este preço eu iria querer o Elvis e o Sinatra a cantar para mim, acompanhados ao piano por Mozart e com originais de Beethoven!
Para além dos preços médios, que ultrapassam os 30 euros, ainda há que contar com deslocações, estadias, parqueamentos, alimentação e... copos!
Se pensarmos que no Rock in Rio de 2010 estiveram 329 mil almas, a 58 euros o bilhete, dá qualquer coisa como mais de 19 milhões de euros! Vamos juntar os outros festivais todos?
Não faço a mais pequena ideia de quanto é que o Prince ou os Natiruts levam por espectáculo, nem é isso que aqui está em causa, mas sim a quantidade de dinheiro que se gasta em espectáculos musicais durante o Verão e falo do gasto individual, de cada um. Pelo que me é dado a observar a grande maioria dos espectadores são jovens. Serão os mesmos que estão desempregados às pazadas e inscritos nos centros de emprego? Também são! E aqui reside o cerne do meu espanto. Eu trabalho (que nem uma maluquinha, a bem da verdade) e até gostava de ir ver um ou outro espectáculo mas não tenho capacidade financeira para o fazer.
Vão convencer-me que cada um dos espectadores vai poupando mês após mês ao longo do ano para pagar a parafernália de festas? Tentem...
Agora gostava de relacionar esta informação com uma realidade que se vive no calor de Verão em Portugal, num Portugal em crise, com elevados índices de desemprego, com famílias em precárias condições, com empresas a fechar e por aí adiante: os festivais de música!
Desconheço se há valores para quanto se gasta por ano em festivais de música. No site Festivais de Verão encontramos uma lista de 25 nomes de Festivais, alguns com tradição como o Super Bock, Super Rock, Optimus Alive ou Rock in Rio e locais como Paredes de Coura ou Zambujeira do Mar fazem parte obrigatória do trajecto de milhares de pessoas que não vivem sem estes espectáculos.
De acordo com o site os preços vão desde 5 euros a... 3500 euros! Estes são para os lugares VIP Deck do Sensation 2010, no pavilhão Atlântico. No fórum deste festival muitos eram os que se perguntavam se o preço era mesmo aquele e na página do Facebook do festival quando alguém perguntou se ainda havia bilhetes, a organização respondeu que sim, mas que os do Vip Deck estavam a esgotar.
Os 3500 euros contemplam “Mesas exclusivas no VIP Deck; Mesa para 10 pessoas com um serviço inesquecível que inclui: parqueamento automóvel; acesso ao interior do pavilhão por uma entrada exclusiva; encaminhamento por hospedeiras; permanência num espaço exclusivo construído para o efeito, com apenas 16 mesas e vista privilegiada para o espectáculo; 4 garrafas à escolha (champanhe; whisky; vodka ou gin) e ainda refrigerantes diversos.” Mesmo assim, são 350 euros por pessoa e por este preço eu iria querer o Elvis e o Sinatra a cantar para mim, acompanhados ao piano por Mozart e com originais de Beethoven!
Para além dos preços médios, que ultrapassam os 30 euros, ainda há que contar com deslocações, estadias, parqueamentos, alimentação e... copos!
Se pensarmos que no Rock in Rio de 2010 estiveram 329 mil almas, a 58 euros o bilhete, dá qualquer coisa como mais de 19 milhões de euros! Vamos juntar os outros festivais todos?
Não faço a mais pequena ideia de quanto é que o Prince ou os Natiruts levam por espectáculo, nem é isso que aqui está em causa, mas sim a quantidade de dinheiro que se gasta em espectáculos musicais durante o Verão e falo do gasto individual, de cada um. Pelo que me é dado a observar a grande maioria dos espectadores são jovens. Serão os mesmos que estão desempregados às pazadas e inscritos nos centros de emprego? Também são! E aqui reside o cerne do meu espanto. Eu trabalho (que nem uma maluquinha, a bem da verdade) e até gostava de ir ver um ou outro espectáculo mas não tenho capacidade financeira para o fazer.
Vão convencer-me que cada um dos espectadores vai poupando mês após mês ao longo do ano para pagar a parafernália de festas? Tentem...
terça-feira, 6 de julho de 2010
A revista Happy. Uma tristeza!
Comprei e li este fim de semana a revista Happy. Já a tinha folheado em consultórios e noutros locais de passagem, mas comprar e ler, de fio a pavio, foi a primeira vez.
Não vou repetir. É uma revista para mulheres, no pior dos sentidos. Para mulheres idiotas e, cúmulo, que gostam de ser idiotas, que fazem gala na sua idiotia, que a passeiam, que a mostram com um sorriso, com orgulho.
A Wikipédia vale o que vale mas, neste caso, vale mesmo a pena ler o que diz sobre a revista :
“Happy Woman é uma revista portuguesa.
Surgiu em Março de 2006 através da editora Baleska Press.
Apresentando conceitos inovadores, a publicação ocupa primeiro lugar das revistas mensais femininas mais vendidas em Portugal.
Apresenta internamente sete eixos: Privado, Auto-Estima, A Dois, Alimentação, Júnior, Saúde e Check-Out. A revista descreve mensalmente o percurso da mulher moderna, cosmopolita, aspiracional, que sabe o que quer e que, certamente, quer mais da vida. Apresenta uma incidência bastante forte em temas sexuais, sendo estes o principal chamariz para a compra por impulso em banca. Fala bastante sobre moda, e publicita marcas de roupa, acessórios, perfumes, etc, mostrando o artigo e o devido preço. Incluiu também um voucher de 20% de desconto nos locais assinalados na revista.
Foi a revista que mais vendas mensais conseguiu nos ultimos 20 anos. Em Agosto de 2009, superou os 133.000 exemplares vendidos (resultados com o sumatório de vendas em banca, assinaturas e vendas em bloco). Em Dezembro de 2009 a Happy Woman vendia cerca de 97.000 exemplares e continua a cair nas vendas no inicio de 2010.
Apesar dos "15 minutos de fama", honra seja dada pois foi no segmento feminino a unica revista mensal a superar os 100.000 exemplares vendidos e introduzir o sistema de vouchers de desconto (hoje utilizado pela maioria das revistas do mesmo segmento) que originou uma legião de fãs deste sistema que na euforia do desconto compravam por vezes 10 revistas de uma só vez.”
Do texto anterior apenas acrescentei alguns espaços entre palavras, para permitir a leitura, de resto... sic. Assentos e herros são originais.
Porém, aquilo que considero a pérola do texto é o facto da revista ter sido a que mais vendas mensais conseguiu nos últimos 20 anos, quando tem apenas 4... Porque não desde o tempo do Império Romano? Sem querer ser muito má, talvez porque não saibam o que é o Império Romano (o presente do verbo ser é propositado).
Em busca da página da internet da revista encontrei vários blogs cuja leitura me teria poupado o dinheiro que paguei pelo exemplar da revista, uma vez que são todos unânimes. Aparentemente as compras são feitas por causa dos vales de desconto, aos quais se insiste em chamar voucher, que é muito mais fino. O uso de inglesismos é frequente – veja o título - talvez por isso o corrector ortográfico se baralhe e permita os erros que deambulam por ali.
Os artigos são assinados maioritariamente por uma jornalista: é a visão única da mesma pessoa sobre vários assuntos, todos sexualizados e tão depressa tratam as leitoras por tu como por você. As fotografias também não escapam e resumem-se a mulheres esqueléticas e anoréxicas.
As frases de abertura dos artigos pretendem ser lindas, marcantes, um prelúdio para a leitura subsequente que nos envolverá, mas algumas não têm sequer oditnes.
Vejamos a entrada da página 66, um mimo: “Não foi fácil. Mas no dicionário Happy nunca encontrei a palavra ‘desistir’. Depois de muita pesquisa, muitos e-mails e muitos telefonemas internacionais para cidades com fusos horários estranhos...”
Os dois primeiros períodos do texto anterior fazem um casamento daqueles que se conseguiria entre uma abóbora e um rato de computador. Mas a minha preferência vai para os ‘fusos horários estranhos’! Bem, haviam de ver os da Lua!
Na página 79 o primeiro parágrafo tem cinco interrogações no final de cinco frases. Acontece porém que nenhuma delas é uma interrogação, são todas afirmações. Mas esta explicação é fácil de se perceber: havia por ali uma gaveta cheia de pontuação e tiravam uma mão cheia de pontos de interrogação. Or should I say interrogation mark?
Adora misturar inglesismos e a lista é longa. Mostra resorts, spa’s, tem uma secção de summer kids, tem voucher’s, ensina a fazer kobe beef, tem receitas light, conta histórias onde se põe after sun nas costas e outras hot sobre erotic vacations, afirma que nude is trendy e mostra vários looks e sapatos urban high.
A Happy é tão cool!
Não vou repetir. É uma revista para mulheres, no pior dos sentidos. Para mulheres idiotas e, cúmulo, que gostam de ser idiotas, que fazem gala na sua idiotia, que a passeiam, que a mostram com um sorriso, com orgulho.
A Wikipédia vale o que vale mas, neste caso, vale mesmo a pena ler o que diz sobre a revista :
“Happy Woman é uma revista portuguesa.
Surgiu em Março de 2006 através da editora Baleska Press.
Apresentando conceitos inovadores, a publicação ocupa primeiro lugar das revistas mensais femininas mais vendidas em Portugal.
Apresenta internamente sete eixos: Privado, Auto-Estima, A Dois, Alimentação, Júnior, Saúde e Check-Out. A revista descreve mensalmente o percurso da mulher moderna, cosmopolita, aspiracional, que sabe o que quer e que, certamente, quer mais da vida. Apresenta uma incidência bastante forte em temas sexuais, sendo estes o principal chamariz para a compra por impulso em banca. Fala bastante sobre moda, e publicita marcas de roupa, acessórios, perfumes, etc, mostrando o artigo e o devido preço. Incluiu também um voucher de 20% de desconto nos locais assinalados na revista.
Foi a revista que mais vendas mensais conseguiu nos ultimos 20 anos. Em Agosto de 2009, superou os 133.000 exemplares vendidos (resultados com o sumatório de vendas em banca, assinaturas e vendas em bloco). Em Dezembro de 2009 a Happy Woman vendia cerca de 97.000 exemplares e continua a cair nas vendas no inicio de 2010.
Apesar dos "15 minutos de fama", honra seja dada pois foi no segmento feminino a unica revista mensal a superar os 100.000 exemplares vendidos e introduzir o sistema de vouchers de desconto (hoje utilizado pela maioria das revistas do mesmo segmento) que originou uma legião de fãs deste sistema que na euforia do desconto compravam por vezes 10 revistas de uma só vez.”
Do texto anterior apenas acrescentei alguns espaços entre palavras, para permitir a leitura, de resto... sic. Assentos e herros são originais.
Porém, aquilo que considero a pérola do texto é o facto da revista ter sido a que mais vendas mensais conseguiu nos últimos 20 anos, quando tem apenas 4... Porque não desde o tempo do Império Romano? Sem querer ser muito má, talvez porque não saibam o que é o Império Romano (o presente do verbo ser é propositado).
Em busca da página da internet da revista encontrei vários blogs cuja leitura me teria poupado o dinheiro que paguei pelo exemplar da revista, uma vez que são todos unânimes. Aparentemente as compras são feitas por causa dos vales de desconto, aos quais se insiste em chamar voucher, que é muito mais fino. O uso de inglesismos é frequente – veja o título - talvez por isso o corrector ortográfico se baralhe e permita os erros que deambulam por ali.
Os artigos são assinados maioritariamente por uma jornalista: é a visão única da mesma pessoa sobre vários assuntos, todos sexualizados e tão depressa tratam as leitoras por tu como por você. As fotografias também não escapam e resumem-se a mulheres esqueléticas e anoréxicas.
As frases de abertura dos artigos pretendem ser lindas, marcantes, um prelúdio para a leitura subsequente que nos envolverá, mas algumas não têm sequer oditnes.
Vejamos a entrada da página 66, um mimo: “Não foi fácil. Mas no dicionário Happy nunca encontrei a palavra ‘desistir’. Depois de muita pesquisa, muitos e-mails e muitos telefonemas internacionais para cidades com fusos horários estranhos...”
Os dois primeiros períodos do texto anterior fazem um casamento daqueles que se conseguiria entre uma abóbora e um rato de computador. Mas a minha preferência vai para os ‘fusos horários estranhos’! Bem, haviam de ver os da Lua!
Na página 79 o primeiro parágrafo tem cinco interrogações no final de cinco frases. Acontece porém que nenhuma delas é uma interrogação, são todas afirmações. Mas esta explicação é fácil de se perceber: havia por ali uma gaveta cheia de pontuação e tiravam uma mão cheia de pontos de interrogação. Or should I say interrogation mark?
Adora misturar inglesismos e a lista é longa. Mostra resorts, spa’s, tem uma secção de summer kids, tem voucher’s, ensina a fazer kobe beef, tem receitas light, conta histórias onde se põe after sun nas costas e outras hot sobre erotic vacations, afirma que nude is trendy e mostra vários looks e sapatos urban high.
A Happy é tão cool!
segunda-feira, 5 de julho de 2010
Herr Professor
Estive a ler um blog que está fechado ao público. O autor aconselhou-se com gente avisada, à excepção da minha pessoa, provando assim que não há regra sem excepção e, ao contrário do que a excepção lhe sugeriu, manteve o blog fechado.
Quem sou eu para opinar sobre a logística das ruas da internet, seus jardins e demais lugares? Apenas acho que aquela praça devia ser pública e quanto mais leio, mais confirmo a minha opinião e concluo que o autor é um grandíssimo tonto!
Pergunto-me frequentemente onde vai ele buscar aqueles livros e como os interioriza? Eu, que gosto de imaginar coisas, vejo-o com uma grande pança, não grávido, mas com uma misturadora na barriga onde ele vai pondo tudo aquilo que lhe apetece: leituras novas e antigas, aprendizagens, pensamentos, ideias, reflexões, fúrias, deleites, sensações e eu sei lá mais o quê!
Não há guerras naquela escrita. Ou seja, ele passa sem fronteiras duma critica feroz a um olhar meigo e carinhoso, como se fosse um shampoo daqueles de dois em um, mas do qual não queremos gastar nada e vamos olhando o frasco sem desperdiçar uma gota, guardando-o sempre para melhor ocasião.
Mas que raio, não concebo que aquilo seja escrito para meia dúzia de pessoas! Não me entra na cabeça! Volto sempre à ideia de praça e pergunto: e se fechassem a praça de Santa Maria Maior e não nos deixassem ver a Basílica com o mesmo nome? Porque razão estão as imagens rupestres de Foz Côa à mostra? Lembrar-se-á o autor da polémica que envolveu a questão da preservação e acesso público às pinturas? Não se regozija ele quando encontra leituras inesperadas, em locais inesperados?
Sinceramente não percebo a razão da clandestinidade. Que não tenha página no facebook, eu percebo, que não use o twitter, também, mas interditar o blog... não!
Estou oficialmente de birra com ele!
Quem sou eu para opinar sobre a logística das ruas da internet, seus jardins e demais lugares? Apenas acho que aquela praça devia ser pública e quanto mais leio, mais confirmo a minha opinião e concluo que o autor é um grandíssimo tonto!
Pergunto-me frequentemente onde vai ele buscar aqueles livros e como os interioriza? Eu, que gosto de imaginar coisas, vejo-o com uma grande pança, não grávido, mas com uma misturadora na barriga onde ele vai pondo tudo aquilo que lhe apetece: leituras novas e antigas, aprendizagens, pensamentos, ideias, reflexões, fúrias, deleites, sensações e eu sei lá mais o quê!
Não há guerras naquela escrita. Ou seja, ele passa sem fronteiras duma critica feroz a um olhar meigo e carinhoso, como se fosse um shampoo daqueles de dois em um, mas do qual não queremos gastar nada e vamos olhando o frasco sem desperdiçar uma gota, guardando-o sempre para melhor ocasião.
Mas que raio, não concebo que aquilo seja escrito para meia dúzia de pessoas! Não me entra na cabeça! Volto sempre à ideia de praça e pergunto: e se fechassem a praça de Santa Maria Maior e não nos deixassem ver a Basílica com o mesmo nome? Porque razão estão as imagens rupestres de Foz Côa à mostra? Lembrar-se-á o autor da polémica que envolveu a questão da preservação e acesso público às pinturas? Não se regozija ele quando encontra leituras inesperadas, em locais inesperados?
Sinceramente não percebo a razão da clandestinidade. Que não tenha página no facebook, eu percebo, que não use o twitter, também, mas interditar o blog... não!
Estou oficialmente de birra com ele!
Crise: acidente, apuro, carência, escassez, falta, perigo, perturbação, etc., mas tudo negativo.
Uns amigos pediram-me ajuda para eu lhes marcar as férias via internet. Conheço os portais das viagens e faço isto com frequência: dizem-me quantos são, para onde gostavam de ir, quanto querem gastar e eu faço-lhes uma pequena selecção.
Estou de boca aberta com os resultados deste ano!
Os desejos dos primeiros interessados passavam por um combinado em Havana e Varadero e os segundos queriam ir ao Egipto, ambos durante a primeira quinzena de Agosto.
Porém, surpresa das surpresas, na data pretendida nem uns nem outros podem realizar a viagem. Porquê? Porque não há lugares! Estão esgotados!
Ontem no Jornal da noite dum canal qualquer ouvi a notícia que as taxas de preenchimento dos estabelecimentos hoteleiros do Algarve estão a 90% para Agosto, o que me parece muito bom para a indústria hoteleira.
Mas face a estas duas notícias pergunto: onde anda a carência, a falta, a escassez, ou seja, a Crise? Tendo em conta a minha vida, se calhar mudou-se lá para casa e só eu sei dela! Convive comigo, dorme comigo, está ali, tipo lapa, alojada na minha colmeia, sem manifestar querer ir-se embora, tomando conta de tudo, desde o frigorífico até ao combustível do carro.
Um local onde ela também não se mostra é nos festivais de música que pululam por Portugal: de norte a sul do país o Verão trás nomes sonantes, ou não, para nos deleitarem com as suas músicas, composições, interpretações, tudo a preços de chuva mas em altura de seca, e onde eu não vou, limitando-me a ver os cartazes que estão espalhados pela cidade, na televisão, nos jornais, nos transportes públicos e em mais mil sítios e sobre os quais ouvimos depois dizer que os números de espectadores foram enormes e as expectativas superadas.
Por outro lado ainda vejo os preços de roupa, calçado e acessórios anunciados em revistas e questiono-me sobre quem serão os compradores! Eu sou cliente fiel do mercado do Algueirão onde compro sandálias e sapatos (artigo do qual sou fanática, vá lá, para dar voz às minhas amigas...) a três euros o par e é por isso que tenho vários, está bem, muitos! Também compro nas lojas chinesas todo o tipo de chinesice uma vez que não consigo ir mais longe. Para além de roupa, da última vez que lá fui comprei também um espremedor que se enfia na fruta e não ao contrário como habitualmente. É muito engraçado e fica mesmo bem dentro da gaveta dos talheres!
Quem me conhece sabe que não sou de me queixar e considero-me uma pessoa com pensamentos e atitudes muito positivas, mas vejo pessoas à minha volta com 600 e 700 euros de ordenados e tendo em conta que é a GRANDE maioria, fico sem resposta a várias perguntas: quem compra aquela roupa e aqueles sapatos? Quem vai ver os concertos? Quem vai de férias que até os aviões se enchem? Quem?
Será isto uma espécie de fenómeno tipo Gripe A? A Crise é a Gripe A mas com outro nome! Passamos da fobia de morrermos às pazadas com a gripe para a fobia com a crise; mas afinal onde está ela?
Em Maio de 2009 o director do Instituto de Higiene e Medicina Tropical, Jorge Torgal, no 3º Congresso sobre «Pandemias na era da globalização» afirmava que uma epidemia da gripe A em Portugal causaria dois a três milhões de infectados e 75 mil mortos. Desde há anos, com especial incidência nos últimos meses, que ouvimos falar da Crise mas, da mesma forma que a Gripe A só atacou algumas pessoas, a Crise segue o mesmo percurso.
Ora como, graças a Deus, não tive Gripe A, cabedou-me na sorte a Crise! E mais ainda, como este ano apenas uma pequena constipação me passou pelo corpo, agora, como uma espécie de compensação, num estranho mas verdadeiro equilíbrio, como uma retaliação da vida, a Crise instala-se de armas e bagagens lá em casa!
Ora porra! Desculpem lá, mas isto é demais!
A todos os que disserem que esta teoria não tem fundamento, uma vez que a Gripe A não matou o que se previa, nem às redondezas chegou e, assim, a Crise vai chegar a todos quantos não foram afectados pela gripe, eu pergunto: Então quem é que enche os aviões?
Não, há aqui outra coisa que não sei explicar, mas sei, de certeza garantida!, que a Crise está na minha casa.
Se alguém conhecer um bom exterminador de Crises, por favor, deixe-me aqui o contacto.
Estou de boca aberta com os resultados deste ano!
Os desejos dos primeiros interessados passavam por um combinado em Havana e Varadero e os segundos queriam ir ao Egipto, ambos durante a primeira quinzena de Agosto.
Porém, surpresa das surpresas, na data pretendida nem uns nem outros podem realizar a viagem. Porquê? Porque não há lugares! Estão esgotados!
Ontem no Jornal da noite dum canal qualquer ouvi a notícia que as taxas de preenchimento dos estabelecimentos hoteleiros do Algarve estão a 90% para Agosto, o que me parece muito bom para a indústria hoteleira.
Mas face a estas duas notícias pergunto: onde anda a carência, a falta, a escassez, ou seja, a Crise? Tendo em conta a minha vida, se calhar mudou-se lá para casa e só eu sei dela! Convive comigo, dorme comigo, está ali, tipo lapa, alojada na minha colmeia, sem manifestar querer ir-se embora, tomando conta de tudo, desde o frigorífico até ao combustível do carro.
Um local onde ela também não se mostra é nos festivais de música que pululam por Portugal: de norte a sul do país o Verão trás nomes sonantes, ou não, para nos deleitarem com as suas músicas, composições, interpretações, tudo a preços de chuva mas em altura de seca, e onde eu não vou, limitando-me a ver os cartazes que estão espalhados pela cidade, na televisão, nos jornais, nos transportes públicos e em mais mil sítios e sobre os quais ouvimos depois dizer que os números de espectadores foram enormes e as expectativas superadas.
Por outro lado ainda vejo os preços de roupa, calçado e acessórios anunciados em revistas e questiono-me sobre quem serão os compradores! Eu sou cliente fiel do mercado do Algueirão onde compro sandálias e sapatos (artigo do qual sou fanática, vá lá, para dar voz às minhas amigas...) a três euros o par e é por isso que tenho vários, está bem, muitos! Também compro nas lojas chinesas todo o tipo de chinesice uma vez que não consigo ir mais longe. Para além de roupa, da última vez que lá fui comprei também um espremedor que se enfia na fruta e não ao contrário como habitualmente. É muito engraçado e fica mesmo bem dentro da gaveta dos talheres!
Quem me conhece sabe que não sou de me queixar e considero-me uma pessoa com pensamentos e atitudes muito positivas, mas vejo pessoas à minha volta com 600 e 700 euros de ordenados e tendo em conta que é a GRANDE maioria, fico sem resposta a várias perguntas: quem compra aquela roupa e aqueles sapatos? Quem vai ver os concertos? Quem vai de férias que até os aviões se enchem? Quem?
Será isto uma espécie de fenómeno tipo Gripe A? A Crise é a Gripe A mas com outro nome! Passamos da fobia de morrermos às pazadas com a gripe para a fobia com a crise; mas afinal onde está ela?
Em Maio de 2009 o director do Instituto de Higiene e Medicina Tropical, Jorge Torgal, no 3º Congresso sobre «Pandemias na era da globalização» afirmava que uma epidemia da gripe A em Portugal causaria dois a três milhões de infectados e 75 mil mortos. Desde há anos, com especial incidência nos últimos meses, que ouvimos falar da Crise mas, da mesma forma que a Gripe A só atacou algumas pessoas, a Crise segue o mesmo percurso.
Ora como, graças a Deus, não tive Gripe A, cabedou-me na sorte a Crise! E mais ainda, como este ano apenas uma pequena constipação me passou pelo corpo, agora, como uma espécie de compensação, num estranho mas verdadeiro equilíbrio, como uma retaliação da vida, a Crise instala-se de armas e bagagens lá em casa!
Ora porra! Desculpem lá, mas isto é demais!
A todos os que disserem que esta teoria não tem fundamento, uma vez que a Gripe A não matou o que se previa, nem às redondezas chegou e, assim, a Crise vai chegar a todos quantos não foram afectados pela gripe, eu pergunto: Então quem é que enche os aviões?
Não, há aqui outra coisa que não sei explicar, mas sei, de certeza garantida!, que a Crise está na minha casa.
Se alguém conhecer um bom exterminador de Crises, por favor, deixe-me aqui o contacto.
Vidas.
Outra vez o metro. Sempre o metro. À minha frente vai sentada uma mulher poderosa, com ombros bem maiores do que o banco. É preta e tem braços fortes como os de uma lutadora. Realço a cor da sua pele para evidenciar as nódoas negras que tem nos braços. São impressionantes e, a bem da verdade, nunca tinha visto uma pele negra com nódoas negras. Veste uma camisola de alças branca o que lhe marca ainda mais a cor e deixa ainda mais à mostra as marcas nos braços. Pergunto-me como as terá feito, ela, que é forte e robusta. Não vejo alguém a bater-lhe pois uma palmada dela leva por diante um homem, sem dúvida alguma. Como as terá feito? Nunca lhe vi os olhos porque foi a dormir o caminho todo.
Questiono-me sobre as vidas que se tocam nos transportes. Tocam-se sem se intrometerem umas nas outras, mas tocam-se, criando um labirinto de círculos entre os que se sentam lado a lado sem nunca se terem visto, os que se aninham no meio da multidão com mais intimidade do que, quantas vezes, se tem com maridos e mulheres.
Olhamo-nos mutuamente fingindo que não nos olhamos: uma mulher bonita, um vestido curto e uns joelhos à mostra, um homem sensual, uma mulher mal vestida, outra carregada de pulseiras e fios e anéis como uma árvore de Natal, outro alguém que fala ao telefone aos gritos, um jovem que ouve música como se a aparelhagem estivesse ligada para toda a carruagem dançar, uma criança a fazer birra, um pedinte cego, outro pedinte coxo, outro pedinte e outro e outro, um casal de estrangeiros que, de mapa na mão, olham as estações e comentam sobre quem vai à sua volta pensando não estar a ser compreendidos, um indiano com o seu magnífico turbante que consegue criar um espaço à sua volta pois todos se afastam dele, dois homens com ar profundamente cansado que falam em russo entre si, rindo e mostrando os dentes de ouro, duas adolescentes com os pelos púbicos à mostra, mulheres e homens sem características que os dissemelhem dos demais, metidos consigo, a pensar sabe-se lá em quê, provavelmente todos na mesma coisa.
Mas porque teria a mulher as nódoas negras, tão negras, nos braços? Apeteceu-me bater em alguém. Mas saí e deixei-a a dormir. Mas ela veio no meu pensamento. Comigo.
Questiono-me sobre as vidas que se tocam nos transportes. Tocam-se sem se intrometerem umas nas outras, mas tocam-se, criando um labirinto de círculos entre os que se sentam lado a lado sem nunca se terem visto, os que se aninham no meio da multidão com mais intimidade do que, quantas vezes, se tem com maridos e mulheres.
Olhamo-nos mutuamente fingindo que não nos olhamos: uma mulher bonita, um vestido curto e uns joelhos à mostra, um homem sensual, uma mulher mal vestida, outra carregada de pulseiras e fios e anéis como uma árvore de Natal, outro alguém que fala ao telefone aos gritos, um jovem que ouve música como se a aparelhagem estivesse ligada para toda a carruagem dançar, uma criança a fazer birra, um pedinte cego, outro pedinte coxo, outro pedinte e outro e outro, um casal de estrangeiros que, de mapa na mão, olham as estações e comentam sobre quem vai à sua volta pensando não estar a ser compreendidos, um indiano com o seu magnífico turbante que consegue criar um espaço à sua volta pois todos se afastam dele, dois homens com ar profundamente cansado que falam em russo entre si, rindo e mostrando os dentes de ouro, duas adolescentes com os pelos púbicos à mostra, mulheres e homens sem características que os dissemelhem dos demais, metidos consigo, a pensar sabe-se lá em quê, provavelmente todos na mesma coisa.
Mas porque teria a mulher as nódoas negras, tão negras, nos braços? Apeteceu-me bater em alguém. Mas saí e deixei-a a dormir. Mas ela veio no meu pensamento. Comigo.
quinta-feira, 1 de julho de 2010
A mosca das visitas
Sempre ouvi dizer que quando nos aparece uma mosca grande, gorda e barulhenta, não tardará que nos entrem visitas pela porta dentro.
Hoje de manhã cheguei ao trabalho e esvoaçava no meu gabinete o equivalente a um 747 das moscas, um verdadeiro Jumbo com asas!
Negra, gordíssima como se estivesse grávida de várias ninhadas de mosquinhas, isto se fosse uma mosca, pois se fosse um mosco era uma espécie de personificação da gula, como a personagem de Seven.
Chamei uma colega para me ajudar a expulsar a intrusa e, com dois sacos de plástico nas mãos, lá a mandámos sair. Porém, o rasto ficou, e com ele ficou também o sortilégio da mosca.
Passados poucos minutos chamaram-me para cumprimentar uma antiga colega, há anos que estava desaparecida das nossas vistas, mas logo hoje passou aqui e resolveu dar-se a ver, e aqui estava ela. Ainda o som dos beijos ressoava no ar do adeus e volte sempre, prazer em vê-las, entrava uma antiga aluna, fiel aos nossos serviços de prestadores de informação. Mais abraços e sorrisos e beijos e exclamações então por aqui e explicações e eteceteras.
Mais dez minutos de trabalho e entra o Chefe pelo meu gabinete adentro, que este não precisa de bater à porta, vai entrando. A sua presença por estas paragens é rara, raríssima. Vem acompanhado de dois estrangeiros que me apresenta, faz dois dedos de conversa e vai embora.
Isto tudo até à hora do almoço. Pergunto-me que influência exercerão as moscas no universo das visitas inesperadas? Sim, porque eu acredito que foi aquela mosca monstra que provocou este corropio! Para que conste!
Hoje de manhã cheguei ao trabalho e esvoaçava no meu gabinete o equivalente a um 747 das moscas, um verdadeiro Jumbo com asas!
Negra, gordíssima como se estivesse grávida de várias ninhadas de mosquinhas, isto se fosse uma mosca, pois se fosse um mosco era uma espécie de personificação da gula, como a personagem de Seven.
Chamei uma colega para me ajudar a expulsar a intrusa e, com dois sacos de plástico nas mãos, lá a mandámos sair. Porém, o rasto ficou, e com ele ficou também o sortilégio da mosca.
Passados poucos minutos chamaram-me para cumprimentar uma antiga colega, há anos que estava desaparecida das nossas vistas, mas logo hoje passou aqui e resolveu dar-se a ver, e aqui estava ela. Ainda o som dos beijos ressoava no ar do adeus e volte sempre, prazer em vê-las, entrava uma antiga aluna, fiel aos nossos serviços de prestadores de informação. Mais abraços e sorrisos e beijos e exclamações então por aqui e explicações e eteceteras.
Mais dez minutos de trabalho e entra o Chefe pelo meu gabinete adentro, que este não precisa de bater à porta, vai entrando. A sua presença por estas paragens é rara, raríssima. Vem acompanhado de dois estrangeiros que me apresenta, faz dois dedos de conversa e vai embora.
Isto tudo até à hora do almoço. Pergunto-me que influência exercerão as moscas no universo das visitas inesperadas? Sim, porque eu acredito que foi aquela mosca monstra que provocou este corropio! Para que conste!
O calendário é uma paleta de frio e calor
O calendário é uma paleta de frio e calor
A contenda do dia a penetrar a noite é um orgasmo colectivo de cor
A aurora é a sublime mortalha da noite e eu rendo-me a ela como a um tapete persa
O sol, prisioneiro do céu, mostra-se, maduro, logo pela manhã
Concentração de especiarias, só para saborear com o olhar e cheirar com a pele
O banco de jardim descansa, impetuosamente sossegado. Espera, tem tempo
Eu sou a sua primeira cliente.
A seguir virão laranjas, romãs, fruta doce e cigarros que deitam fumo vermelho de raiva
O banco de jardim esgota-se com o acto complacente do sentar
A contenda do dia a penetrar a noite é um orgasmo colectivo de cor
A aurora é a sublime mortalha da noite e eu rendo-me a ela como a um tapete persa
O sol, prisioneiro do céu, mostra-se, maduro, logo pela manhã
Concentração de especiarias, só para saborear com o olhar e cheirar com a pele
O banco de jardim descansa, impetuosamente sossegado. Espera, tem tempo
Eu sou a sua primeira cliente.
A seguir virão laranjas, romãs, fruta doce e cigarros que deitam fumo vermelho de raiva
O banco de jardim esgota-se com o acto complacente do sentar
Vagueiam almas perdidas que se encontram algures
Vagueiam almas perdidas que se encontram algures
Pessoas passam apressadas
Pensam em coisas diferentes daquelas com que ocupam o tempo
Deixam-se seduzir pela sua própria imaginação
Que os leva onde a coragem os impede.
Encontram-se e desencontram-se
Fazem-se e desfazem-se
Contentando-se e insatisfazendo-se
Esperam que o momento surja,
Qual alquimia já madura tanto foi o tempo que já se esperou
Desconhecimento imenso de nós,
Medo do desejo anunciado, dádiva eterna do que se não tem.
Continuam a caminhar sobre terra, lama, areia, pântanos,
Sem se atreverem a voar, sem se atreverem a saltar,
Com medo da sensação de pairar sobre o ar que nos falta
Quando imaginamos a realização do que o desejo nos pede.
Ardente olhar de quem se satisfaz
Não sabendo e ignorando o que as suas próprias mãos
(Com vida adquirida naquele instante), vão resolver fazer:
Apertar, agarrar, abraçar, bater, ou simplesmente
Acenar e dizer adeus.
Pessoas passam apressadas
Pensam em coisas diferentes daquelas com que ocupam o tempo
Deixam-se seduzir pela sua própria imaginação
Que os leva onde a coragem os impede.
Encontram-se e desencontram-se
Fazem-se e desfazem-se
Contentando-se e insatisfazendo-se
Esperam que o momento surja,
Qual alquimia já madura tanto foi o tempo que já se esperou
Desconhecimento imenso de nós,
Medo do desejo anunciado, dádiva eterna do que se não tem.
Continuam a caminhar sobre terra, lama, areia, pântanos,
Sem se atreverem a voar, sem se atreverem a saltar,
Com medo da sensação de pairar sobre o ar que nos falta
Quando imaginamos a realização do que o desejo nos pede.
Ardente olhar de quem se satisfaz
Não sabendo e ignorando o que as suas próprias mãos
(Com vida adquirida naquele instante), vão resolver fazer:
Apertar, agarrar, abraçar, bater, ou simplesmente
Acenar e dizer adeus.
Leituras
Há dois ou três dias na I série do Diário da República foram publicados 30 diplomas. Vinte e cinco são sobre caça: anexam-se zonas de caça, renovam-se as transferências de gestão de zonas de caça, desanexam-se zonas de caça, concessionam-se zonas de caça, excluem-se terrenos de zonas de caça, criam-se novas zonas de caça.
Presumo que a equipa legisladora responsável por este assunto tenha reunido e despachado vinte e cinco questões duma assentada, que é como quem diz, só com um tiro.
Das muitas coisas curiosas que se encontram no DR ontem destacava-se a aprovação do regime jurídico do combate à infestação por térmitas.
O Decreto Legislativo Regional n.º 22/2010/A da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, em treze páginas de orientações, recomendações e alertas, proíbe a entrada de térmitas no território!
Li a proibição e imaginei uma pessoa a entrar num avião com duas ou três térmitas pela trela, a ser questionada pela autoridades sanitárias, ou outras quaisquer, sobre a tentativa de entrada ilegal em território açoriano e não pude deixar de me rir.
Por outro lado, imaginei um chuveiro gigante instalado nos vários aeroportos açorianos onde os passageiros têm que tomar duche antes de entrar nos aviões para garantir que não transportam qualquer bicharoco que se instale indevidamente em qualquer bolso ou algibeira. No caso das viagens por barco deixará de haver passadeiras que ajudam os passageiros a subir a bordo, tendo estes, a partir de agora, que chegar aos navios a nado, certificando-se assim que os ocupantes clandestinos ficam na água.
Não há leituras insípidas!
Presumo que a equipa legisladora responsável por este assunto tenha reunido e despachado vinte e cinco questões duma assentada, que é como quem diz, só com um tiro.
Das muitas coisas curiosas que se encontram no DR ontem destacava-se a aprovação do regime jurídico do combate à infestação por térmitas.
O Decreto Legislativo Regional n.º 22/2010/A da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, em treze páginas de orientações, recomendações e alertas, proíbe a entrada de térmitas no território!
Li a proibição e imaginei uma pessoa a entrar num avião com duas ou três térmitas pela trela, a ser questionada pela autoridades sanitárias, ou outras quaisquer, sobre a tentativa de entrada ilegal em território açoriano e não pude deixar de me rir.
Por outro lado, imaginei um chuveiro gigante instalado nos vários aeroportos açorianos onde os passageiros têm que tomar duche antes de entrar nos aviões para garantir que não transportam qualquer bicharoco que se instale indevidamente em qualquer bolso ou algibeira. No caso das viagens por barco deixará de haver passadeiras que ajudam os passageiros a subir a bordo, tendo estes, a partir de agora, que chegar aos navios a nado, certificando-se assim que os ocupantes clandestinos ficam na água.
Não há leituras insípidas!
Lisboa, 25 de Junho de 2007
Para Diário de Notícias, Secção de Classificados
De acordo com o contacto telefónico feito anteriormente, junto envio um texto e uma fotografia, para serem publicados na secção de necrologia, nos moldes combinados, bem como o cheque para pagamento.
“A família de Camila Ribeiro agradece a todos quantos se dignaram fazer-nos companhia no passado dia 20 de Junho.
A Camila é uma força da natureza, um porto cujo pontão está sempre a tremer com forças invisíveis e sente os seus alicerces abalados permanentemente.
A Camila não morreu. Foi viajar.”
Miguel Freitas
De acordo com o contacto telefónico feito anteriormente, junto envio um texto e uma fotografia, para serem publicados na secção de necrologia, nos moldes combinados, bem como o cheque para pagamento.
“A família de Camila Ribeiro agradece a todos quantos se dignaram fazer-nos companhia no passado dia 20 de Junho.
A Camila é uma força da natureza, um porto cujo pontão está sempre a tremer com forças invisíveis e sente os seus alicerces abalados permanentemente.
A Camila não morreu. Foi viajar.”
Miguel Freitas
Perspectivas
Mandaram-me esta fotografia como exemplo de coisa feia, má. Como exemplo de desarrumação, de desleixo. Como exemplo do exagero, do excesso.
Eu publico-a como exemplo daquilo que pode ser encontrado na minha casa.
Eu publico-a como exemplo daquilo que pode ser encontrado na minha casa.
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