No âmbito
da organização de eventos científicos da casa onde trabalho e a propósito de um
seminário, convidámos um especialista norueguês para vir falar da sua
experiência. Dada a confirmação da disponibilidade começámos a tratar da
deslocação. O senhor pediu para ser ele a gerir esse assunto, informando-nos
que sofria da doença celíaca e nem todas as companhias de aviação estavam
preparadas para transportar pessoas com necessidades especiais de alimentação. Por
quem é! Faça o favor!
Tratado aquele
assunto, marcado o hotel, informei-me junto da Associação Portuguesa de Celíacos
quais os restaurantes onde poderíamos levar o senhor, sem corremos riscos. Por coincidência,
o Hotel escolhido estava numa espécie de fase final de certificação e decidiu-se
que o almoço do dia do seminário seria encomendado ao hotel, nosso vizinho, e o
jantar dessa noite, seria no restaurante do dito.
Assim, ao
almoço recolheram-se pratos de peixe e carne, pão, entrada e sobremesa à hora
marcada e o senhor não provou o nosso divinal arroz de peixe, feito de uma
forma única e gulosamente lambido.
O evento
foi um sucesso de tal ordem que os responsáveis quiseram comemorar com um
jantar à antiga portuguesa e fizeram-no saber ao convidado estrangeiro que
declinou o convite para comemorar depois de jantar. Assim, e cumprindo o que
estava estipulado, estivemos com o senhor durante o seu jantar no hotel, tendo
ele tomado uma refeição completa e nós ficámo-nos por umas entradas e um copo
de vinho, que ele também tomou.
Fosse do
vinho, da euforia ou do que fosse, o senhor reconsiderou e decidiu
acompanhar-nos!
Muito bem!
Por entre
sorrisos de profunda satisfação, felicidade e pela melodia do Bairro Alto aos
seus amores tão dedicado, sentámo-nos num restaurante e pedimos o jantar. Tendo em conta que tinha acabado de jantar opiparamente, o senhor
surpreendeu-nos ao perguntar ao empregado o que tinham sem glúten que ele
pudesse comer. Lá disseram
que não era o primeiro celíaco que recebiam, explicaram o que tinham, pensando nós que ele queria qualquer coisa leve para nos acompanhar. Quando trouxeram um prato maior que
os nossos, não verbalizámos a percepção do desperdício, mas todos pensámos o mesmo. Porém, e para nossa grande estupefacção, ele limpou o prato num ápice, empurrado por um Dão que deslizava
como enguias.
O companheirismo
que se estabeleceu com o senhor não impedia que nos ríssemos até às lágrimas,
relembrando todas as preocupações com a sua alimentação, tantos mails para trás
e para a frente, quantos cuidados que, afinal, tinham nascido dele próprio, e
afinal, concluímos, abades, há-os em todos os países e para lá de todas as
doenças.
Que lhe
tenha feito bom proveito é o que se deseja!
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