quinta-feira, 20 de maio de 2010

Um acidente em Perafita

Aquela coisa aborrecida que nos obriga a levantar todos os dias bem cedo e que se chama trabalho tem-me assoberbado na última semana. É isso e as dores de dentes.
Hoje quando me dirigia para apanhar o transporte que me conduz ao meu emprego ouvi uma notícia no rádio que me despertou a atenção: um acidente em Perafita!
Ora acidentes há-os todos os dias em Lisboa e esses, aparentemente, seriam os que me causariam alguma preocupação por via de me poderem complicar a vida; também me poderia preocupar com acidentes na margem sul do Tejo onde vivem várias colegas minhas, na linha de Cascais e Estoril para onde os meus pais foram à praia ou em Freixo de Espada de Cinta pela curiosidade que o nome sempre desperta. Mas não, o acidente foi em Perafita – onde se cortou o trânsito numa determinada artéria! – e foi este que me chamou à atenção.
Acontece que na minha família as mulheres são todas generosas, ou seja, mais para o gordo; elas dirão que são cheias, fortes, entroncadas, maciças! Mas a verdade é que são gordas, com as poucas excepções à regra, da qual eu não faço parte, como bem se sabe.
E o que tem o acidente em Perafita com a generosidade das formas das mulheres da minha família? Tudo, pois a minha Tia R. vive em Perafita! Embora não conduza veio-me logo à ideia ter sido ela a provocar o acidente, com a sua cintura (que tão bem conheço pois descendo dela) de mesa redonda, ligeiramente levantada atrás, como se fossemos peruas. E se ela ia a passar na rua, andando calmamente na passadeira e beio um destrambelhado ao bolante dum beículo que a fez boar bigorosamente numa biagem que mais parecia ser num abião? Sim, sim, Perafita fica perto de Matosinhos, mas isso não interessa nada agora... e se ela não ia na passadeira? Terá sido a culpada?
Por via das dúvidas conduzi mais devagar até chegar ao meu destino, com receio de poder contribuir para o aumento de notícias semelhantes que já visualizava (auditivamente, é claro!): “Sobrinha da mulher que causa acidente em Perafita – com corte de trânsito numa artéria! – causa acidente na Damaia por desconcentração ao saber do acidente da Tia. Isto é a globalização senhores ouvintes! É a globalização a funcionar: um acidente provoca outro a mais de 300 quilómetros graças à nossa rádio pois se não fossemos nós, nada disto teria acontecido!”
Minutos depois ouvir-se-ia: “Informações de última hora dizem-nos que afinal o acidente em Perafita – com corte de trânsito numa artéria! – não foi causado pela Tia da mulher que causou o acidente na Damaia; na verdade em Perafita não houve qualquer acidente, e a artéria foi cortada devido a obras. Mas a Tia da mulher que causou o acidente na Damaia ao saber da notícia da sobrinha que tinha causado um acidente por pensar que ela, a Tia, tinha provocado um acidente, ficou preocupadíssima e pediu-nos que emitíssemos uma mensagem: Filha, querida sobrinha, espero que estejas bem quando ouvires esta mensagem. Atão tu pensavas que eu tinha causado uma acidente? Atão tu não sabes que eu não conduzo? Atão onde foi que tiveste o acidente? Ouvi que foi na Damaia... a Damaia não era onde moravam muitos lá do Sobral? Atão se eram assim tantos ainda deve haver alguns e porque não procuras alguém que te ajude? Diz que és neta do Cabo da Guarda! Olha, tenho muitas saudades tuas, quando quiseres vir visitar-me já sabes, mas até é melhor que não venhas agora porque andam com obras aqui na rua e vê lá tu, até disseram na rádio que tinha sido um acidente com corte de trânsito numa artéria e que tinha sido eu, mas não fui e... ah, pois mas isso tu sabes, olha as melhoras e beijinhos da Tia R.

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