quarta-feira, 26 de maio de 2010

4 de Junho de 2007

Meu amigo
Não te desculpes de bateres sempre na mesma tecla: temos que bater sempre na mesma tecla, para ver se alguém OUVE!!!!!
As crianças sim, as crianças, mas porque será que tenho a sensação que, quando ouço falar nelas ( e escusado será dizer que concordo contigo a 100%!) parece-me ouvir palavras vãs da boca duma linda Miss Universo que adora crianças e anseia pela paz no mundo???
Claro que a nossa aposta, a nossa força, a nossa esperança, a nossa vida! tem que ser depositada nas nossas crianças! Qualquer criança é nossa! Entendo essa partilha como partilho contigo o ar que respiro! Não posso ser dona dele e não tenho o direito de o adulterar! As crianças são o oxigénio do nosso futuro, são o transporte que nos levará avante no tempo e no espaço. E somos nós, em casa, no mar da família que temos a obrigação de lhes mostrar os caminhos que há a percorrer para que elas escolham e façam as suas opções. Opções de futuro. (É curioso porque acabo de escrever esta expressão e associo-a a uma muito familiar nos meios bancários: opções de futuro...)
Eu mostro ao Duarte as pessoas que vivem na rua, chamo-lhe a atenção para os drogados, explico-lhe que há crianças que andam na escola pública e não têm o Sr. enfermeiro para lhes tratar das feridas quando se magoam depois de jogarem à bola! Não têm um quarto para elas, nem brinquedos...ou então têm brinquedos, mas não têm uma coisa que ele gosta muito... os pais ao pé dele para se deitarem no chão e jogarem jogos... há coisas que o Duarte não esquece... a noite em que cheguei muito tarde e o pai o deixou ficar acordado e escreveram papéis de boas vindas à mãe que estavam espalhados pelo chão em direcção ao quarto dele, onde cobertores repousavam escondidos por entre os lençóis, para que eu pensasse que eram eles que dormiam... e quando destapei a roupa... novo papelinho... lá fui para o meu quarto, onde novo monte de roupa se escondia e... novo papelinho... no meio da sala erguia-se uma tenda e eles estavam a dormir lá dentro, meios vestidos e absolutamente felizes! Lembro outra ocasião, cuja acção repetimos há dois anos... no primeiro dia de praia, metemos os pés no areal e largamos a correr em direcção á agua e mergulhamos vestidos! Ele fica doido de alegria e fala nisto durante todo o ano, como uma cumplicidade maior entre os pais e ele. Uma delícia que não faz mal a ninguém e apenas deixa alguns pais, que nos observam, a pensar que somos malucos... somos saudavelmente malucos, acho eu...
Ou então, no Alentejo, de galochas calçadas, irmos brincar para o riacho e, mesmo que chova, apanhamos "flores" para enfeitar a casa... e sempre, mas sempre, sempre, sempre, sempre... a conversar!
Em casa, de vez em quando, fingimos que não há luz e andamos com velas...jantamos, arrumamos a cozinha, lemos, contamos histórias, eu sei lá... às escuras as pessoas têm a tendência de se juntarem mais.
E mesmo assim, claro que acho que passamos pouco tempo juntos, permitisse Deus que estivéssemos ainda mais tempo juntos.
Já conversámos sobre a pedofilia, embora evite que ele veja imagens na televisão, pois são sempre propositadamente sensacionalistas.
Mas devo dizer-te que um dia destes, no final do ano passado, ele veio para casa com um murro na cara, mas com um sorriso... então contou-me, e eu confirmei mais tarde... iam jogar à bola e ninguém queria na sua equipa um garoto que usa um aparelho nos ouvidos... chamaram-lhe nomes, etc. e o Duarte defendeu-o... resultado, acabaram à tareia, mas chorei ao ouvir o meu filho dizer que os outros miúdos, com certeza não gostavam que lhes chamassem ranhosos, porque chamavam, então, surdo ao (não me lembro o nome)? A culpa não era dele por ser surdo!. Nesse dia adorei-o ainda mais!
Mas sinto que ainda podia fazer mais coisas e tenho sempre pena quando vou ouvir as palestras à escola, e há pais que se enfadam com o que ouvem e suspiram de alivio quando se termina... e nós achamos que fazemos tão pouco...
Por isso e muitas mais coisas... o investimento é neles que tem que ser feito e há tanta coisa contra nós... tudo compete connosco! A televisão, os amigos, o social...
É difícil competir com amigos que têm tudo... é difícil gerir certas amizades que, tu queres ver continuar a crescer, mas cujos padrões de orientação são diferentes, nos respectivos pais.
O meu marido é pacífico, mas eu desoriento-me com certas coisas. Isto para não falar dos telemóveis dados a crianças com 5 anos!!!!
Os nossos filhos vivem pensando que as "coisas" caem do céu! E quando crescem e se tornam adolescentes, revoltam-se ao descobrir que o pai natal não existe e a rena não vai deixar cair presentes em cima da cabeça deles e quando se tornam adultos agem da forma que lhes parece mais fácil para atingir os seus objectivos, como se fossem os únicos ocupantes do planeta e arredores e TUDO o resto fossem ...coisas, e não pessoas, como eles!
É contra isto que temos que agir e lutar... levá-los, a eles, a escolher e a negar o facilitismo que, mais tarde, se transformará em dificuldades a dobrar! Não vale a pena andar a olhar para o céu se esperamos ver um sujeito a voar com capa pelas costas e um S no peito... outros valores mais altos se levantam... porque será que tanta gente os quer derrubar???
Ajuda-me tu, amigo, a responder a esta pergunta e vai batendo na tecla as vezes que te apeteça... e serão poucas.

Recebe um beijo, ou dois ou três, adiantamento que te faço em nome do fim de semana!
Camila

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