sexta-feira, 5 de abril de 2013

Da boa disposição


Boccaccio, Marquês de Sade, Fiódor Dostoievski, O. Henry, Jerome K. Jerome, Saki, P. G. Wodehouse, Enrique Jardiel Poncela, Ring Lardner, Dezső Kosztolányi, James Thurber, Boris Vian, Mario Benedetti, Woody Allen, Raymond Queneau e Alexandre O’Neill. O que tem toda esta gente em comum?
São deles os textos da Ficções, Revista de Contos de Humor, editada pela Visão nos idos de 1993, que descobri há uns dias e acabo agora de ler.
Dos dezasseis contos, onze são escritos na primeira pessoa o que me transporta aquela sensação irmanada de certa ilusão, eu sei, que alguns são verdadeiros. 
Não podem ser? É por isso que isto se chama Ficções? De certeza? Vamos perguntar aos autores, vamos? Pois, bem me parecia.
Será o humor mais fácil no eu? A proximidade que se cria num relato em primeira mão, que pressupõe o imediatismo do testemunho, cria maior credibilidade? O riso vem mais depressa porque imaginamos aquela figura como protagonista daquela topografia cómica? Não sei, mas que resulta, resulta e ler O’Neill a dizer que já explicou que não se chamava Aníbal e sim O’Neill e o interlocutor a insistir no Aníbal é delicioso.
A reunião de todos estes nomes, alguns dos quais desconhecidos para mim, foi propiciadora de excelentes momentos pois que cada um tem o seu compasso de leitura, e induz-nos a ler em ritmos diferentes, uma polca para Há lugar para dois do Marquês de Sade, uma ópera para as Confissões de um humorista de O. Henry, Jerome K. Jerome em step com o seu O custo da bondade, uma rumba para A sociedade de acidentes de Ukridge de P. G. Wodehouse, um fado para Um amor oculto de Enrique Jardiel Poncela, Ring Lardner em samba com Falta-me o ar!, um óbvio blues em O tradutor cleptómano de Dezső Kosztolányi, um inevitável jazz para Woody Allen e A puta de Mensa, entre outros estilos musicais.
Ler este pequeno volume no Metro dá-nos a sensação de mudar de roupa a cada estação, de beijar vários passageiros que entram e saem, todos bem-dispostos e galhardos.
Deixo aqui uma sugestão, sobre a qual quero depois os devidos direitos: se as bulas dos medicamentos, xanaxes e quejandos, forem substituídas por textos deste gabarito, ninguém precisará de engolir uma só drageia e povoam-se todos os lugares de leitura de imensas gargalhadas. 

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